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Sousândrade 

Poussin, Venus Presenting  Arms to Aeneas

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


Ensaio, crítica, resenha & comentário: 


Fortuna crítica: 


Alguma notícia do autor:

Sousândrade, Joaquim de Sousândrade (1833 - 1902)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ticiano, O amor sagrafo e o profano, detalhe

 

Bernini_Bacchanal_A_Faun_Teased_by_Children

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, The Triumph of Neptune

 

 

 

 

 

Sousândrade


 

Biografia: Joaquim de Sousândrade  (1833 - 1902)

 

Joaquim de Sousa Andrade, nascido na vila de Guimarães, no Maranhão, formou-se em Letras pela Sorbonne, em Paris, onde fez também o curso de engenharia de minas. Republicano convicto e militante, transfere-se, em 1870, para os Estados Unidos. Morando em Nova Iorque, funda o periódico republicano "O Novo Mundo", publicado em português. Retornando ao Maranhão, comemora com entusiasmo a Proclamação de República. Dedica-se ao ensino de Língua Grega no Liceu Maranhense e passa, no final da vida, por enormes dificuldades financeiras. Morre em São Luís, abandonado, na miséria e considerado louco. Sua obra foi esquecida durante décadas. Resgatada no início da década de 1960, pelos poetas Augusto e Haroldo de Campos, revelou-se uma das mais originais e instigantes de todo o nosso Romantismo. Em Nova Iorque, publica sua maior obra, o poema longo O Guesa Errante (1874/77), em que utiliza recursos expressivos, como a criação de neologismos e de metáforas vertiginosas, que só foram valorizados muito depois de sua morte. Em 1877, escreveu: "Ouvi dizer já por duas vezes que o Guesa Errante será lido 50 anos depois; entristeci - decepção de quem escreve 50 anos antes".
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Acis and Galatea

 

 

 

 

 

Sousândrade


 

Harpa XXXII


Dos rubros flancos do redondo oceano
Com suas asas de luz prendendo a terra
O sol eu vi nascer, jovem formoso
Desordenando pelos ombros de ouro
A perfumada luminosa coma,
Nas faces de um calor que amor acende
Sorriso de coral deixava errante.
Em torno de mim não tragas os teus raios,
Suspende, sol de fogo! tu, que outrora
Em cândidas canções eu te saudava
Nesta hora d'esperança, ergue-te e passa
Sem ouvir minha lira. Quando infante
Nos pés do laranjal adormecido,
Orvalhado das flores que choviam
Cheirosas dentre o ramo e a bela fruta,
Na terra de meus pais eu despertava,
Minhas irmãs sorrindo, e o canto e aromas,
E o sussurrar da rúbida mangueira
Eram teus raios que primeiro vinham
Roçar-me as cordas do alaúde brando
Nos meus joelhos tímidos vagindo.
 

 

 

William Blake (British, 1757-1827), Christ in the Sepulchre, Guarded by Angels

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R Roldan-Roldan

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Delaroche, Hemiciclo da Escola de Belas Artes

 

 

 

 

 

Sousândrade


 

O Guesa / Canto terceiro


As balseiras na luz resplandeciam —
oh! que formoso dia de verão!
Dragão dos mares, — na asa lhe rugiam
Vagas, no bojo indômito vulcão!
Sombrio, no convés, o Guesa errante
De um para outro lado passeava
Mudo, inquieto, rápido, inconstante,
E em desalinho o manto que trajava.
A fronte mais que nunca aflita, branca
E pálida, os cabelos em desordem,
Qual o que sonhos alta noite espanca,
"Acordem, olhos meus, dizia, acordem!"
E de través, espavorido olhando
Com olhos chamejantes da loucura,
Propendia p'ra as bordas, se alegrando
Ante a espuma que rindo-se murmura:
Sorrindo, qual quem da onda cristalina
Pressentia surgirem louras filhas;
Fitando olhos no sol, que já s'inclina,
E rindo, rindo ao perpassar das ilhas.
— Está ele assombrado?... Porém, certo
Dentro lhe idéia vária tumultua:
Fala de aparições que há no deserto,
Sobre as lagoas ao clarão da lua.


Imagens do ar, suaves, flutuantes,
Ou deliradas, do alcantil sonoro,
Cria nossa alma; imagens arrogantes,
Ou qual aquela, que há de riso e choro:
Uma imagem fatal (para o ocidente,
Para os campos formosos d'áureas gemas,
O sol, cingida a fronte de diademas,
índio e belo atravessa lentamente):
Estrela de carvão, astro apagado
Prende-se mal seguro, vivo e cego,
Na abóbada dos céus, — negro morcego
Estende as asas no ar equilibrado.
 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata

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Lauro Marques

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Sousândrade


 

Elogio do Alexandrino


Asclepiádeo verso: à evolução do poema
Das sestas, cadenciar d'altas antigüidades,
já porque bipartido em fúlgidas metades
Reata em conjunção opostos de um dilema,
E já por ser de gala a forma do matiz
Heleno na escultura e lácio na linguagem
Reacesda, de Alexandre, em fogos de Paris:
Paris o tom da moda, o bom gosto, a roupagem;
Que desperta aos tocsins, galo às estrelas d'alva,
Que faz revoluções de Filadélfia às salvas
E o verso-luz, fardeur das formas, de grandeza,
o verso-formosura, adornos, lauta mesa
Ond' tokay, champanh', flor, copos cristal-diamantes
Sobrelevam roast-beef e os queijos e o pudding.
Porém, mens divinior, poesia é o férreo guante:
Ao das delícias tempo, o fácil verso ovante,
o verso cor de rosa, o de oiro, o de carmim,
Dos raios que o astro veste em dia azul-celeste;
E para os que têm fome e sede de justiça,
O verso condor, chama, alárum, de carniça,
D'harpas d'Ésquilus, de Hugo, a dor, a tempestade:
Que, embora contra um deus "Figaro" impiedade
Vesgo olhinho a piscar diga tambour-major,
Restruge alto acordando os cândidos espíritos
Às glórias do oceano e percutindo os gritos
Réus. Ao belo trovoar do magno Trovador
Ouve-se afinação no mundo brasileiro,
Acorde tão formoso, hodierno, hospitaleiro,
Flamívomo social, encantador. Fulgura
Luz de dia primeiro, a nota formosura,
Que ao jeová-grande-abrir faz novo Éden luzir.
 

 

 

Octavio Paz, Nobel

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Antonio Mariano de Lima