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Clarice Lispector 

Titian, Three Ages

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Poemas que (não) são de Clarice:

Nota do Editor:
 

Da parceria poética, algumas póstumas
 

Os poemas desta página são resultado do arranjo em versos, feito pelo padre Antônio Damázio [onde você anda, meu amigo?], de textos em prosa da extraordinária escritora Clarice Lispector. Nesta saudável mania de todo-mundo-copiar-todo-mundo-sem-citar-a-fonte, tem umas "pages" por aí publicando estes textos sem lhes indicar a parceria do padre e como se fossem poesia originariamente feita por Clarice. É bom que se diga que Clarice apesar de escrever de forma não versificada, era poeta verdadeira, pois, como diz Benedicto Ferri de Barros, não basta ao texto estar quebrado em linhas para ser poesia. Clarice fazia poesia sem quebrar as linhas; esta é a homenagem que lhe presta o Jornal de Poesia, quando incentivei o padre Damázio a levar o projeto Clarice adiante.

Uma pena que o padre sumiu, não sei onde lhe andam as alpercatas, porque seria muito válido pedir a ele que indicasse a origem dos textos que arranjou de forma tão feliz.

Poemas de Clarice Lispector arranjados pelo Padre Antonio Damázio:

Ainda sobre parcerias poéticas, na forma de um texto originalmente em prosa versificado por outrem:

 

PS: Pronto, meus amigos, o padre vive! E me mandou a fonte dos poemas de Clarice:

1. “Dá-me tua mão”, in: A Paixão segundo GH, 8. ed, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1979, p. 94

2. “A Perfeição”, in: A Descoberta do Mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 226

3. “Mas há a Vida”, in: A Descoberta do Mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 539

4. “Amor à Terra”, in: A Descoberta do Mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 302

5. “Meu Deus, me dê a coragem..”, in: Um Sopro de Vida, 4. ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1978, pp. 154-155

6. “A Lucidez Perigosa”, in: A Descoberta do Mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 636

7. “Nossa Truculência”, in: A Descoberta do Mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984, p. 386

8. “Estrela Perigosa”, in: BORELLI, Olga. Clarice Lispector – Esboço para um possível retrato. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 82

9. “Quero escrever o borrão vermelho de sangue”, in: BORELLI, Olga. Clarice Lispector – Esboço para um possível retrato. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 65
 


Um texto que corre por aí que não é de Clarice: 


Fortuna crítica: 


Alguma notícia da autora:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ruth, by Francesco Hayez

 

Albrecht Dürer, Mãos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Plaza de toros

 

 

 

 

 

Clarice Lispector


 

Biografia:

 

Clarice Lispector (Tchetchelnik Ucrânia 1925 - Rio de Janeiro RJ 1977) passou a infância em Recife e em 1937 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se formou em direito. Estreou na literatura ainda muito jovem com o romance Perto do Coração Selvagem (1943), que teve calorosa acolhida da crítica e recebeu o Prêmio Graça Aranha. Em 1944, recém-casada com um diplomata, viajou para Nápoles, onde serviu num hospital durante os últimos meses da Segunda Guerra. Depois de uma longa estada na Suíça e Estados Unidos, voltou a morar no Rio de Janeiro. Entre suas obras mais importantes estão as reuniões de contos A Legião Estrangeira (1964) e Laços de Família (1972) e os romances A Paixão Segundo G.H. (1964) e A Hora da Estrela (1977). Clarice Lispector começou a colaborar na imprensa em 1942 e, ao longo de toda a vida, nunca se desvinculou totalmente do jornalismo. Trabalhou na Agência Nacional e nos jornais A Noite e Diário da Noite. Foi colunista do Correio da Manhã e realizou diversas entrevistas para a revista Manchete. A autora também foi cronista do Jornal do Brasil. Produzidos entre 1967 e 1973, esses textos estão reunidos no volume A Descoberta do Mundo. Sobre Clarice, escreve a crítica francesa Hélène Cixous: "Se Kafka fosse mulher. Se Rilke fosse uma brasileira judia nascida na Ucrânia. Se Rimbaud tivesse sido mãe, se tivesse chegado aos cinqüenta. (...). É nessa ambiência que Clarice Lispector escreve. Lá onde respiram as obras mais exigentes, ela avança. Lá, mais à frente, onde o filósofo perde fôlego, ela continua, mais longe ainda, mais longe do que todo o saber".

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Bathsheba

 

 

 

 

Clarice Lispector


 

 

Este poemeto não é de Clarice
 

Nota do Editor:
 

Recebi este email de:
 

Anna Christina Saeta de Aguiar

web.editora@anjosdeprata.com.br

http://www.anjosdeprata.com.br
 

"Poemeto para ser lido "de cima pra baixo e de baixo pra cima"- este poeminha engraçadinho é bastante antigo nas listas de e-mail que rolam pela internet. Inicialmente divulgado sem autoria, ultimamente tem sido atribuído a Clarice Lispector. Caso alguém saiba quem escreveu esta graciosa brincadeirinha, peço a gentileza de entrar em contato comigo web.editora@anjosdeprata.com.br para que o nome seja divulgado":
 

Não te amo mais
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis
Tenho certeza que
Nada foi em vão
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada
Não poderia dizer mais que
Alimento um grande amor
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...

 

 

 

Ticiano, Flora

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Ronaldo Cagiano

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Velazquez, A forja de Vulcano

 

 

 

 

Clarice Lispector


 

Dá-me a tua mão


 

Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.


De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.


Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
- nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo,
e a respiração contínua do mundo
é aquilo que ouvimos
e chamamos de silêncio.

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Admiration Maternelle

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José Valgode

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tintoretto, Criação dos animais

 

 

 

 

Clarice Lispector


 

A perfeição


O que me tranqüiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.


O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.


Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.


O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.


Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.
 

 

 

 

Michelangelo, Pietá

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Luiz Edmundo Alves

 

 

 

 

 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata, detail

 

 

 

 

Miguel Leocádio Araújo

O Povo, Fortaleza, Ceará, Brasil

(06.10.2008)

Vida & Arte

livro

Pequenas epifanias de Clarice

Miguel Leocádio Araújo
Especial para O POVO

O professor e mestre em literatura, Miguel Leocádio Araújo, analisa o livro Felicidade Clandestina

 


 

Quando lançou Felicidade clandestina (1971), Clarice Lispector (1920-1977) já era uma escritora consagrada. Com vários romances, livros de contos e crônicas escritas para jornais, ela decide dar destino a um material já conhecido de seu público.

Os 25 contos ali enfeixados haviam saído em A legião estrangeira (1964) ou como crônicas para o Jornal do Brasil, onde Clarice manteve uma coluna semanal, de 1967 a 73, completando-se com As águas do mundo, um trecho do romance Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres (1969). Nenhum texto inédito, mas era como se fosse. O livro de 64 ofuscara-se pela publicação de A paixão segundo G. H., romance impactante, considerado uma de suas obras-primas, também de 64. Já as crônicas para jornal perdiam-se no tempo, levadas pelo imediatismo da edição do dia seguinte. Logo, o suporte do livro, ao retomar os textos, deu-lhes uma nova vida e uma permanência tão longeva quanto qualquer outra publicação da escritora, com seus temas mais caros e suas técnicas de composição tão peculiares.

Um das temáticas recorrentes é a infância, com suas experiências marcantes fixando-se na memória. Um exemplo: o texto que dá título à obra lança o leitor no universo do desejo inocente de uma menina por um livro. Uma vez de posse do objeto desejado, ela experimenta uma "felicidade clandestina" que a acompanhará por toda a vida, pegando-a de surpresa, provocando sensações inesperadas, como as "pequenas epifanias" de que falou Caio Fernando Abreu. Felicidade difícil e momentânea, porém forte.

Aliás, a infância protagoniza vários contos: um menino que se desestabiliza com a visão do dente de ouro e com o amor maternal de uma prima (Miopia progressiva); a garota que, num triste carnaval marcado doença da mãe, mesmo depois de ter sua fantasia de flor destruída, ainda é reconhecida como "uma rosa" e não como simples menina (Restos do carnaval); a ruivinha que se depara com um cão basset também "ruivo" e vê nesse encontro algo similar à descoberta da suprema afinidade entre os seres (Tentação); ou a menina que roubava rosas e pitangas por achar que estas "pediam" para serem roubadas em vez de permanecerem nos galhos e apodrecerem ("Cem anos de perdão"), entre algumas outras. Alguns destes textos são baseados em reminiscências da própria autora, conforme depoimentos de familiares colhidos por suas biógrafas. Trata-se então do vivido que é ficcionalizado, como se Clarice quisesse passar sua vida a limpo.

Também recorrentes são os animais, que aparecem como contraponto às personagens (pessoas), às vezes devolvendo-lhes uma humanização já esquecida. Assim, há galinhas, macacos ou insetos como a barata, que, vale lembrar, constitui a matriz deflagradora da experiência de mergulho em si mesma, da narradora-protagonista de A paixão segundo G. H.

Embora alguns textos apresentem ação, respeitando a etimologia do termo "conto", no sentido de relatar um fato acontecido, outros se fazem na exploração de uma atmosfera, um sentimento ou uma reflexão, contrariando o ato de "contar uma história". Em O ovo e a galinha, totalmente despojado de enredo, tomam-se os dois elementos do título como metáforas da existência, ao mesmo tempo em que representam os objetos e os seres tragados pela voracidade do olhar em busca de compreendê-los.

Neste sentido, é muito freqüente a associação da obra clariceana com a filosofia existencialista, representada sobretudo por Jean-Paul Sartre, autor do romance A náusea e do ensaio filosófico O ser e o nada. Os questionamentos existenciais, suas angústias e vicissitudes, estão associados à sondagem da vida interior das personagens e à própria elaboração literária, constituindo-se como metalinguagem consciente de seu lugar de procura, que mais pergunta do que responde, ancorando-se no cotidiano, como acontece em "Menino a bico de pena".

E é no cotidiano que se localiza a tão falada epifania clariceana, que nas palavras de Affonso Romano de Sant'Anna seria "o relato de uma experiência que a princípio se mostra simples e rotineira, mas que acaba por mostrar toda a força de uma inusitada revelação", apresentando-se como "iluminação súbita" na consciência das personagens, descortinando sua verdadeira condição. Fugazes e imediatas, essas epifanias, na verdade, nunca são "pequenas", pois guardam a tensão viva da clandestinidade dos afetos soterrados pelas máscaras sociais de cada um.

Miguel Leocádio Araújo é mestre em Literatura Brasileira (UFC), com dissertação sobre a obra de Clarice Lispector.


 

Clarice Lispector nasceu numa aldeia de Tchetchelnik, na Ucrânia, no dia 10 de dezembro de 1920, durante a fuga dos pais para a América. Em 1922, os Lispector chegam a Maceió, no Brasil, onde já tinham familiares. Aqui, Haia Lispector muda de nome, passando a chamar-se Clarice. Três anos depois, a família muda-se para Recife. É de lá que a menina Clarice retirará as suas primeiras lembranças. Também na capital pernambucana a escritora dá os seus primeiros passos. Aos nove anos, após assistir a uma peça de teatro, Clarice Lispector escreve Pobre menina rica, cujos originais perderam-se.

Após ingressar no ensino ginasial, Clarice lê Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Dá-se o encantamento. Na mesma época, passa a escrever com mais intensidade suas primeiras histórias. Sobre elas, afirma uma professora: são estranhas. Não têm qualquer traço de enredo. A autora de A paixão segundo G.H. desabrochava.

Em 1935, Pedro Lispector, cuja esposa morrera cinco anos antes, muda-se com as filhas Clarice e Tânia para o Rio de Janeiro. Entre 1935 e 1939, a jovem Clarice conclui os estudos primários e ingressa na Faculdade Nacional de Direito. No seguinte, com a morte do pai, Clarice passar a morar com a irmã, já casada. Para viver, emprega-se no Departamento de Imprensa e Propaganda. Lá conhecerá Lucio Cardoso, amizade duradoura da escritora.

Perto do coração selvagem, primeiro livro de Clarice Lispector, é escrito em 1942, quando a escritora já havia se casado com o diplomata Maury Gurgel Valente. Sucesso de crítica, à obra iriam se seguir O lustre, A Cidade sitiada, A maçã no escuro, A paixão segundo G.H. e outros, como Água viva e A hora da estrela.
Clarice Lispector morreu em 1997. (Henrique Araújo, Especial para O POVO)

 

 

 

Benedicto Ferri de Barros

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Francisco Perna

 

 

 

 

 

06.10.2008