Architectura

                                                                                             

Um dia, Ela 
desenhará em chãos longínquos a casa só nossa, 
que eu farei com estas mãos.

 

 

Os tijolos, eu os amassarei com os meus pés.

 

 

Às telhas —
hei de aprontar o barro mais macio,
e as formas serão por mim,
uma a uma, completadas;

 

 

Ela as alisará longamente — 

seus dedos molhados de um profundo silêncio:

só os pássaros.

 

Fortaleza, manhã de 19.11.1998

 


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Alexandre Palermo Ramos

 

Sent: Friday, November 09, 2001 11:07 PM

Subject: Comentário sobre Architectura


(Um dia, Ela desenhará em chãos longínquos a nossa casa) Jú, eu achei magnífico a forma que ele dedica o poema a ela, lembrei da carta a minha noiva. Olha que forma mais poética de dizer que ele será apenas um servidor aos desejos da amada, (Ela,desenhará no chão) a ele não cabe nem interpretar uma planta, ela dará forma efetiva a casa, (desenhando-a no chão). Isso para mim também tem o significado que ela definirá os alicerce de suas vidas. Não bastando isso, ele desfecha o verso, com: que eu farei com essas mãos, ele agora construirá com as próprias mãos a casa, dependerá das mãos dele, do trabalho dele: - a sobrevivência!.. e o abrigo do casal.

Adiante, ele define que os materiais, e o que todos comprariam: ele fará. com os pés no barro, um contato primitivo com a natureza, com a terra (para mim significa a harmonia com o universo, a comunhão a paz de espírito. Aí ju, vem um verso lindo, 

As telhas - Hei de aprontar com o barro mais macio. Para o telhado, aquele que os abrigará do sol árduo, das tempestades, do sereno frio da noite; ele tem o cuidado de preparar com o barro mais macio. É o compromisso de cuidar e acariciar, proteger com zelo.

As formas serão por mim, uma a uma completadas. agora sim ele preocupa-se em dar forma, em criar. diferente do alicerce e da forma da casa, onde ela as define; agora ele definirá e moldará as telhas, uma a uma. a proteção, a segurança, o cuidar cabe a ele, e com o barro mais macio.

Ela alisará longamente seus dedos molhados em profundo silêncio: A ela, cabe alisar as telhas, acaricia-lo. Sem contar que dedos molhados tem também sentido de masturbação, de satisfação sexual. Em profundo silêncio... só o mais puro amor curte-se em silêncio... sente-se!

Só pássaros. (deixou-me com a imensa vontade, também, de construir meu ninho.)

 

 

 

 

Beatriz Fernandes

 

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

 

Quanto à Architectura....Ah! Architectura....

Já o tinha lido, não uma, mais várias vezes... só não enviei comentários porque não tinha o que dizer... O que interessa, a forma, o rítmo, a estrutura da frase... o delicioso sentido da construção do ninho, como aparece nos comentários que eu li? O  mais importante é o sentimento que ele desperta além do ninho... a sensualidade do amassar do barro... a excitação do alisar as telhas...

Diz-me, oh Poeta!!! Como uma simples mortal pode descrever com palavras estas sensações?

Abraços e obrigada pelas emoções despertadas...

Bia

 

PS. 

Estás perdoado por escrever meu nome errado.. é Beatriz e não Biatriz e também por me promover a poeta. Aliás, estás perdoado também, por todos os pecados que ainda possas cometer...

Direto para a página de Beatriz Fernandes

 

 

 

 

Carla Pereira

 

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

Esse poema a mim tocou-me de uma forma especial passei-o para meus cadernos para o poder ler mais tarde a meu namorado o nosso sonho é também construir a nossa casa o nosso ninho de amor, o nosso refúgio feito de sonho onde nos achamos e nos completamos um ao outro. 

Um dia desenharei essa casa feita apenas á nossa medida, a casa que ele construirá com as suas mãos e eu com as minhas mãos hei-de ao fim do dia acarinhar as suas mãos cansadas.

Carla

Direto para a página de Carla Pereira

 

 

 

 

Carmen Beltrão

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

Ar, o ar presente em seu poema 
a paisagem que não é pequena 
não é fundo, não é tema 
apenas desenha 
em cores mansas 
o silencioso encontro 

Chi, chiove talvez, ou faça sol 
não importa, haverá arrebol 
e abóbada estrelada 
no ninho da palavra anunciada 

Tec, tecnicamente perfeito 
em simplicidade e música 
em forma e jeito 
em sintetismo cortante 
porque nos encara 
e nos faz derramar rios represados 
de sentimentos e emoções (des)concertantes 

Tu, docemente invades 
nossos âmagos protegidos 
e nos roubas a pintura do amor primevo 
idealizado no olvido 
de nossas vidas secretas 
de poetas 

Ra, raiz de nossa terra 
eis-te faraó-deus que te projetas 
imortal nas palavras 
embora, tal qual cada um de nós 
o mais ínfimo dos homens 
besta e anjo a povoar nossos sonhos 
e (ainda bem) as nossas realidades 

Ave! 

 

 

 

 

Danilo V. B. Silva

 

From: Danillo V. B. Silva Vsildan@aol.com

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

Arquitetura

         Usando as palavras de forma "arquitetônica" construistes um Templo à POESIA, cuja forma foi desenhada por Ela e Tu, como mestre, atijolastes as paredes, com tijolos por ti amassados, com o mesmo carinho que um
amassador de uvas o tem no preparo de um fino vinho, subindo-as até a cumieira que cobristes com telhas por  ti formadas e, por delicadas mãos, alisadas com ternura. Verdadeiro Templo ao Amor, construído a duas mãos.O Silêncio é para a meditação.

 

 

 

 

Edna Menezes

 

Sent: Monday, December 15, 2003 12:06 AM

Soares, esse poema Architectura, parece-me uma emanação mágica que "deambula" entre o branco e o incolor, entre o silêncio e a falta de som, entre a lágrima e a dor. É a construção de um ser em suspense, eternidade de palavra que pensa ser concreto. E como diria Manoel de Barros " pelas palavras posso ver o quanto é branco o silêncio do orvalho". Edna Menezes

Direto para a página de Edna Menezes

 

 

 

 

Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

 

Dom Feitosa:

Acabo de ler o seu poema nesta madrugado do dia 20, que ainda só nasceu no quadrante do relógio.

O que me encanta é essa loucura da cinestesia criada pelas imagens, que só a língua do poeta é capaz de criar. Por isso ele é perigoso e merece ser perseguido pelos poderosos do momento: ele anuncia mundos virtuais que, no entanto, existem em nossa sensibilidade.
            Vate, vade rectro!

Direto para a página de Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes

 

 

 

 

Elíude Viana

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

 

        Architectura ou "Gênesis", Poeta? 

        Pois não haveria melhor resumo à primeira parte da literatura bíblica, Profeta, que esse teu poema. Porque nele, além da presença, quase palpável, do amor, que não foi explicitado no livro da criação, ainda teríamos o resgate da figura da mulher-protagonista-cúmplice, alijada (pois "culpada") no relato da construção do mundo primeiro. 

        Teu louvor sensual ao companheirismo enternece, Poeta. E nos enobrece, a nós mulheres.

                                                                Elíude Viana.

Direto para a página de Elíude Viana

 

 

 

 

Eloí Elizabete Bocheco

 

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

            Que surprise bonita! Um poema escrito em 19.11.98! Gosto tanto dessa ordem sintática que você usa e que dá um toque de beleza e força ao dito."Os tijolos, eu os amassarei com os meus pés"  Também em "hei de aprontar o barro mais macio" — "hei de aprontar" é quase um repouso. Até mais!  Eloí

Direto para a página de Eloí Elizabete Bocheco

 

 

 

 

Emílio Burlamaqui

 

Caro poeta SF

 

Em mãos os poemas Habitação e Architectura, ambos do mais assinalado valor.

A Sra. Fabião, em transatlânticas observações, disse tudo. Ela mesma poeta — sua prosa plena de iluminuras. E oleira, posto que sabe que  barro se alisa com os dedos molhados.

Depois da lusitana Maria Alice, pouco me restaria a comentar. Como ela, fiquei pasmo com o magnífico "só os pássaros"!

A beleza foi a moradora primeira das duas vivendas.

O encontro de dedos (desta vez feito sobre o oceano), Michelangelo chegou a esboçar na Capela Sistina. Mas lá, não chegaram a se tocar — jamais o farão.

Parabéns, Poeta grande; cumprimentos à Sra Fabião e o abraço do 
     

                              Emílio Burlamaqui

Direto para a página de Emílio Burlamaqui

 

 

 

 

Geraldo Vasconcelos

 

Sent: Sunday, April 16, 2006 12:41 AM
Subject: sobre o poema "Architectura"

 
Poeta,
permita-me duas palavras;
com toda licença de Hölderlin,
Rilke e Heine, pois poucas vezes
vi da poesia sublimar-se beleza
e delicadeza em forma de poema
tão lírico e amoroso e humano;
como dixit: só os pássaros...
 
Forte abraço,
Geraldo Vasconcelos.

 

Direto para a página de Geraldo Vasconselos

 

 

 

 

Helder Ventura

 

A poética na arquitectura diz-se uma realidade espacial que pela sua proporção, harmonia e funcionalidade, potencia uma das mais clarividentes e reveladoras experiências que nós humanos podemos viver.

A poética arquitectónica assentará no despreendimento e na capacidade de abstração, mas também na interpretação do que se procura materializar como espaço, na modelação e controle da luz, no "assentamento" na paisagem e na convergência dos tempos de acção, esta última talvez a condição mais difícil de obter...

No entanto, lê poesia apenas quem a procura...

A terra, a transcendência do Amor, a necessidade de (a)riscar, o sonho, a transformação, são tudo matéria do espaço arquitectónico.

Obrigado por me ter provocado esta leitura esquecida da minha profissão.

Helder Ventura

 

 

 

 

João Gomes Moreira

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

         Parabéns pela beleza, concisão, progressão rítmica: uma obra de Arte!

Direto para a página de João Gomes Moreira

 

 

 

 

José Nêumanne Pinto

 

"Architectura" é de um lirismo rasgado, aberto, sem vergonha. Melhor dizendo, sem vergonhas. É de um lirismo que canta, fingindo contar. Mas é também de um lirismo que dói, se fazendo de bálsamo. Ele faz que cura, mas, na verdade, fere, e fere fundo, a paisagem cinzenta deste nosso mundo sem amor e sem humor, o mundo da globalização que desemprega e do mercado que nos vende tudo, em troca de nossa mera alma impura.

"Architectura" é de um lirismo agoniado, fora de moda. De um lirismo também cruel. Porque dá inveja, muita inveja, não saber construir um poema assim, não poder construir um poema assim, não construir um poema assim. O poeta-architecto é um fazedor, e 'faze' tão completamente, que 'faze' o amor que deveras sente. Vai ser inspirado assim lá em Pau Grande, no Raiz da Serra, ô, meu vaqueiro.  

Zé Nêumanne, seu peão

Direto para a página de José Nêumanne Pinto

 

 

 

 

Júlio Rodrigues Correia

 

From: "j.rodrigues.correia" <j.rodrigues.correia@uol.com.br>
Sent: Tuesday, May 22, 2007 3:09 PM
Subject: Architectura

 

Boa tarde poeta Soares,

saudações amazonicas.

Acabo de ler o seu poema Architetura. Primoroso em todos os sentidos. Parido de um mente alcandoradamente privilegida, de um poeta que sabe verdadeiramente versejar castiço.

Poeta, se vc não produzisse mais nada depois desse poema todos nós compreenderíamos. Só este poema basta para colocá-lo como um dos grandes poetas deste Brasil.

Parabéns, poeta.

do julio correia

manaus-am, 22/05/2007
 

Direto para a página de Júlio Rodrigues Correia

 

 

 

 

Lindair

 

Francisco, desculpe a forma rude e pouco poética, mas, Architectura é uma paulada... não tive outra coisa a fazer senão me debulhar em lágrimas... aliás, este não é meu estilo... mas não deu para fazer de outro jeito, tive que chorar mesmo! Já pensou? eu, uma coroa, uma profissional experiente... todos esses rotulozinhos que a gente acumula pela vida afora (a propósito, tenho 27 anos de psi) absolutamente desmanchada!

 Mas, devo lhe dizer que ler sua poesia valeu muito mais que todas as sessões de análise que pudesse ter. A propósito, você me autoriza a imprimi-la e enviá-la para algumas pessoas amigas? Bom, muitas coisas ainda poderia dizer, mas prefiro me recolher e ouvir somente os pássaros... 
                                                                    

                                                  Lindair

Direto para a página de Lindair

 

 

 

 

Luiz Paulo Santana

 

From: "Luiz Paulo Santana" <lupasan@uol.com.br>
Sent: Monday, December 15, 2003 11:00 AM

Francisco, rejubilo-me por você, com tão belas e profundas manifestações. Superam a poesia que é a sua fagulha, o ritual do desprendimento, o rito que embala o voo. Helder Ventura é perfeito ao metaforizar "Architectura": um poema cuja "moradias" é uma doce e bem aventurada paz de espírito. E, com justiça, Elídia se derrama em poesia. Insuportável. Porque não é para suportar. E para se deixar levar na torrente. Como esquecer? Jamais!
 
Fraterno abraço,
 
Luiz

Direto para a página de Luiz Paulo Santana

 

 

 

 

Lustosa da Costa

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

SF

       Sua poética é muito maior do que pensa e do que pensam os contemporâneos. É o que me ocorre dizer ao ler Architectura e reler Thiago,

Lustosa da Costa

Direto para a página de Lustosa da Costa

 

 

 

 

Maria Alicia Vila Fabião

 

Quase escultura... 

Acha que posso achar lindo, mesmo assim? Você, às vezes, escreve versos tão belos que magoam! Como posso não achar lindo? O culminar nessa terceira estrofe!... Sufoca. 

Não importa que as "leónidas" não tenham chovido como se sonhara, nem que SF estivesse por ali meio bobo, ou que a manhã de 19 ainda não tivesse chegado: afinal não só não está incapaz de escrever um único verso como escreve versos como estes! Que me deixariam, também a mim, em profundo silêncio, não fora ter esse lugar "reservado para a sua opinião"... É belo. 

Um abraço, claro, SF. 

Alicia  18.11.98



SF, 

Não se admire do aparente laconismo da minha reacção à supresa com que deparei no endereço que me deu. 

Subitamente, fiquei confusa, devo confessar. Demasiadas idéias ao mesmo tempo, e os olhos a caírem-me, sem explicação na data: não, não era um poema que eu ainda não conhecia, mas sim um, acabado de fazer, quase no minuto; mais: que, para dizer a verdade, só iria ser escrito dali a algumas horas, já que o dia 19 ainda era futuro. 

Arquitectura — escrevemos nós — não é o mesmo que escultura, mas no poema era, pelo menos para mim. 

Porquê? Se tivesse conseguido  desenredar todos os sentimentos, todos os pensamentos que nada deviam ao raciocínio frio,  eu teria conseguido escrever muito e muito mais. 

Assim fiquei-me pela reacção instintiva: dizer-lhe que o achava belo, como continuo a achar. 

É um poema (recuso-me a chamar-lhe poemeto, como a outros que assim classifica) contido, tão completo e perfeito em si mesmo como a mais ínfima, mas perfeita, das moléculas de que podem nascer mundos - porque em si os contém, já. 

Desde o primeiro instante, no aturdimento provocado pela surpresa inicial, o meu cérebro estabeleceu, instintivamente, uma conexão natural, em que a palavra fundamental estava lá, perturbante, quase aparentemente deslocada, inexplicável, no final do poema: pássaros. 

Em tempos, entre as muitas traduções feitas, houve o caso de uma pequena enciclopédia de animais,  para crianças. Foi uma época de pesquisar a vida dos animais na natureza, um deslumbramento de descobertas que não mais iria esquecer. 

Entre eles, sobressaía um pássaro: o jardineiro..., cujo nome completo não consigo recordar. Mais tarde, conheci-o pessoalmente, num programa de televisão. Nem sei se será brasileiro. Não tinha a plumagem das aves-do-paraíso, nem qualquer outra característica que o tornasse particularmente atraente aos olhos dos humanos. No entanto, para mim, ele ficou um símbolo, para todo o sempre. 

(Como gostava de me lembrar do nome completo, porque também ele significativo... Vou chamá-lo apenas, jardineiro.) 

Na época de cortejar a amada, o jardineiro não tomava nenhuma das atitudes, por vezes ridículas, por vezes de uma graciosidade maravilhosa, que os seus confrades tomam para conquistar a companheira da época ou da vida. 

Em vez disso, limitava-se a fazer o ninho, mas a fazê-lo com todo o rigor, com o maior dos cuidados. Era um ninho feito no chão, quase uma casa, à frente da qual estendia o seu jardim.  E não era qualquer flor que lhe servia: o jardineiro punha requintes de bom-gosto na obra que queria oferecer à sua amada: só pétalas de flores azuis, nada de outras cores, que tornariam a sua obra vulgar. Pétalas, vidrinhos, tudo quanto fosse azul... (Não era azul a flor da felicidade, para Novalis? Quem sabe se ele não encarnaria a alma do poeta, na sua procura de felicidade?) Poeta ele era, o jardineiro. Arrumava, voltava a arrumar, mudava as coisas de sítio, escolhia os melhores ângulos... Ficava-se a olhar, a estudar efeitos... Mais do que todos, ele sabia do verdadeiro amor. 

O seu poema? 

A parada nupcial é, nos pássaros, como muito bem sabe, sobretudo, um complexo conjunto de gestos e comportamentos, entre os quais, fundamental, sobressai a construção do ninho. 

"só os pássaros."

SF, o seu poema é extremamente perturbador, além de belo. 

Você põe o mesmo requinte do jardineiro na construção da sua oferenda a "Ela". O trabalho - seu: as mãos, que, tal como na escultura, representam o contacto directo, sobressaem, poderosas... 

O cumprimento dos rituais nos mais ínfimos pormenores, ali: o começar por amassar os tijolos com os próprios pés  Não compra, não procura: faz, amassando, no gesto fundamental, o barro-terra, com os pés (gesto simples, do homem também da terra), para o transformar nos elementos fundamentais da sua oferenda. 

Para as telhas - o culminar da sua obra - guarda o barro mais macio... Quantos mais pormenores? As formas, uma a uma, apenas completadas pelo poeta - que a Ela o desenho, a escolha da oferenda que espera receber: a casa, símbolo de união e intimidade - quando "só nossa". 

"Ela as alisará longamente" - alisar... longamente... O gesto de aceitação, de colaboração, naquele ritual de acasalamento... 

O coração ficou-me, no fim, naquele verso: "seus dedos molhados de um profundo silêncio:" 

Que outro verso podia estar ali? Você, SF, sabe do que fala, da arte do ritual de construir, com as suas próprias mão: o alisar o barro, exige as mãos molhadas — o ritual do amor partilhado, mais puro no silêncio profundo. 

Palavras para quê? "Só os pássaros." 

Sei que não consegui desembaraçar a confusão de pensamentos suscitados pelo seu poema. Só sei que, inexplicavelmente, me calou fundo. 

O que eu não fui capaz de dizer, leia-o você mesmo, SF. 

Aposto que lançou as palavras, sem mesmo se dar conta da perfeição da sua própria "Architectura". Uma contenção plástica perfeita e uma "plasticidade concreta", se é que se pode dizer tal coisa, igualmente perfeita. Você disse tudo: nada a pôr, nada a tirar. 

Acabo, depois de ter dito tudo isto, com a mesma frustração que ontem me manteve quase silenciosa. Sei que não consegui traduzir os sentimentos (não posso falar de pensamentos, neste caso) em palavras. 

"Ela" compreenderá, sem necessidade de explicações, tenho a certeza.

E você saberá que o achei tão belo, que dá vontade de nos embrulharmos nele - e sonharmos com jardineiros-pássaros  e flores azuis, de Novalis. 

Alicia - 19.11.98 



Dois esclarecimentos do autor:

 

Architectura foi realmente escrito na manhã do dia 18.11.98. Por engano, datei-o com 19. Isto, naturalmente, espantou os leitores. Alicia, no primeiro e-mail comenta "que a manhã de 19 ainda não tivesse chegado" 

As "Leónidas", referidas por Alicia, seria a intensa chuva de micrometeoritos anunciada de véspera pelos astrônomos do mundo inteiro. Decepção, foram poucos!

SF

Direto para a página de Maria Alicia Fabião

 

 

 

 

Natalia

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

            Não entendo nada de poesia... adoraria comentar Architectura com as palavras de quem sabe os nomes e as características de fases poéticas, como quem estudou  ou aprendeu de tanto ler... Não tenho essa facilidade.

            Suas palavras me encantam.... é só isso.

 

 

 

 

 

Nei Duclós

 

 

From: Nei Duclós <nei@consciencia.org>

Sent: Tuesday, July 16, 2002 5:40 PM

Subject: Comentário sobre Architectura

 

 

Um dia, o barro


Amor, risco
de areia.
Casa, futuro
suor.

Poema: pássaro
virá do vento
soprar o barro.
O traço em busca
do próprio torso

Depois de breve
mergulho
a palavra
cala

A palma toca telha
e  tijolo.
O dedo molhado
sonda o deserto.

Direto para a página de Nei Duclós

 

 

 

 

Paulo Torquato Tasso

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

 

        Architectura cheira a terra, cheira a origem, cheira a mato, cheira a primórdio, cheira a raiz. As pessoas se deslumbram com isto por estarem, talvez, em busca de algo que não encontram no nosso mundo. O que parece é que você também não está encontrando, haja vista a emoção concentrada em dose cavalar que conseguiu colocar em apenas duas dúzias de palavras. Contudo, traduziu não só sua agonia, mas a de milhares de pessoas: daí a magia do artista.

        Se realmente existirem neste país poetas, intelectuais e críticos que mereçam estes nomes, tua obra será leitura obrigatória para os vestibulares do próximo século (existirá este diabo então?).Você seria sempre artista, independentemente do instrumento de expressão que utilizasse.

 

 

 

 

R. Roldan-Roldan

 

 

Belo poema. Belíssimo. 

Plumas e diamantes no oco do silêncio. 

O sangue contido. 

Fervendo.

Direto para a página de R. Roldan-Roldan

 

 

 

 

Sônia A. Dias

 

 

To: jpoesia@sec.secrel.com.br

 

      Architectura 

      Sê mesmo Sozinho, és Todo e Tudo.

      Só tu és capaz de trazer os pássaros do ninho
      para escutá-los num silêncio 
      que o gesto traz
      mas que o momento o toma
      num arrebatamento assustador

      belíssima construção
      que faz com que tenhamos 
      a sensação do toque suspenso
      do deslizar das mãos 
      numa "Architectura" de barro
      num pisar sobre barro
      num calar de terra no chão

      e que lá fora os pássaros
      continuem cantando 
      e contemplando a "Ela"

      seja frágil poema
      seja forte presença 
      seja "Architectura" inteira

      que os pássaros tragam 
      no bico o barro para que faças
      tua morada 
      e de tua amada

      Feliz estou por estar em ti
      através de tuas palavras.

Direto para a página de Sônia A. Dias

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

William Blake (British, 1757-1827), The Ancient of Days

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Ticiano, Flora

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SB 06.03.2023