Réquiem para Gerardo
					
					 
					
					 
					
					
					
					Dixit Poeta: “Há uma raça dos homens/ e uma raça dos 
					deuses/ e a raça dos que tocam/ pelos bosques dos homens/ a 
					música dos deuses” (in O País dos Mourões, 1963); e disse 
					Tristão de Athayde que a música é a poesia do som, e a 
					poesia é a música da palavra. GERARDO MELLO
 
					MOURÃO, católico e cearense há mais de quatro séculos, da 
					tribo dos Mellos e Mourões da Serra de Ibiapaba, era da raça 
					daqueles poucos que sabiam transubstanciar o som da música 
					dos deuses na palavra cantada da poesia escrita dos homens 
					de todas as raças.
					
					Às 
					3h45 desta sexta-feira (9.3.2007), no Rio de Janeiro de São 
					Sebastião, em silêncio, a morte alcançou o corpo grave do 
					poeta. Requiescat in pace. Aos 90 anos de idade, tendo 
					composto a epopéia das Américas (na trilogia O País dos 
					Mourões e o épico Invenção do Mar), galgara a altura da 
					glória – ainda em vida – acima do sucesso – que só a morte 
					trará – de cantou o Brasil como nunca dantes; contando sua 
					história na história do Ceará Grande e da sua gente, 
					reinventando, no ritmo vertebral do metro grego e latino dos 
					hexâmetros e pentâmetros, em Língua Portuguesa, a poesia de 
					Dante, a poesia de Virgílio e a poesia de Homero, aprendida 
					da voz dos caboclos cantadores da feira de Ipueiras com suas 
					sextilhas de sete sílabas, mourões de oito pés em quadrão e 
					galopes-à-beira-mar endecassílabos.
					
					
					Quando moço, abandonando o seminário redentorista holandês, 
					ingressou na política, onde aprendeu o ofício do jornalismo 
					e arte safar-se das contínuas perseguições (preso dezoito 
					vezes por três ditaduras, condenado a trinta anos de prisão 
					e à pena capital). Aprimorou a vocação natural para letras, 
					afinal poeta nascitur, ao longo de uma odisséia por cinco 
					continentes que o levou do Esteiro de Magalhães ao Estreito 
					de Gibraltar, passando pela Terra do Fogo, Viña del Mar, 
					todo o Brasil desfraldado pelos Bandeirantes, os Estados 
					Unidos, a China, Macau, o Oriente, a Grécia e toda a Europa 
					continental e insular. Rilke dizia que para escrever, o 
					poeta devia antes viajar; o nosso Poeta escreveu por suas 
					viagens para que pudéssemos viajar por sua poesia às 
					distâncias a que hoje chegamos com Caminha, com Camões e com 
					Pessoa, Gerardo nos (e)levou à Eternidade: se os portugueses 
					inventaram o Mar do mundo e o mar inventou o Brasil do Novo 
					Mundo, como dizia Capistrano de Abreu, nosso Gerardo Mello 
					Mourão é uma invenção do Brasil para sempre.
					
					Sem 
					ele, ficamos nós como que órfãos de um pai, o Mundo, mais 
					pobre de um gênio, e eu, além disso, perco um mestre de quem 
					fui discípulo. Requiem aeternam dona eis, Domine.
					 
					
					
					
					*Geraldo Sebastião de Vasconcelos é (2007) estudante da 
					Faculdade de Direito do Recife.
					
					
					
					Direto para a página de Gerardo