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Myriam Fraga


 

Julho

 

Para Cecéu, com a devida licença



Era no mês de julho.
Nenhuma pugna travada,
Nenhum grito.


Só a brisa forasteira
No verde leque
Das gentis palmeiras...


Sala de xadrez cinza-azulado,
Suéter cor-de-rosa.
Depois da praia, o cinema.
Era domingo. Secretamente,
Elisabeth Taylor amava
James Dean.


E o anjo da morte, pálido,
Não cosia
Nenhuma mortalha ainda,
Nenhum pedaço roto do infinito
Dos sonhos que sonhávamos,
Tão bonitos.
 

 

 

Octavio Paz, Nobel

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Vicente Franz Cecim

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Frederic Leighton (British, 1830-1896), Memories, detail

 

 

 

 

 

Myriam Fraga


 

Agosto


Mês de agosto,
Desgosto.


Era de cântaros
(Encântaros)
O barulho da chuva
Nos telhados.


A casa não tinha
Sete torres
Mas o amor era tanto
Que matava.


Mês de agosto,
— Feliz aniversário.


Só o gosto)
O explícito, o cruel,
O fino gosto,
De estender toalhas
Nos altares.
 

 

 

Frederic Leighton (British, 1830-1896), Antigona

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Luís Antonio Cajazeira Ramos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

John Martin (British, 1789-1854), The Seventh Plague of Egypt

 

 

 

 

 

Myriam Fraga


 

Setembro


Subitamente
Te invoco, minha Baby
Babylonia,
Neste setembro secreto,
Sem flores, sem
Asas de borboleta
E raízes brotando.


Teu nome Baby, longe,
Longe, longe,
Como a síntese perfeita,
Gosto de mel e laranjas.


Teu nome Baby, Babylônia
A perversa, a pervertida,
Ilusão de contar
A derradeira estória.


Todo o tempo carregando
Os meus jardins de sonho
E o doce sabor
Dos inúteis mistérios.


Nada mais resta agora.
Nem a lembrança do rio
Correndo em minhas pernas
Nem a sombra das muralhas
Onde ganiam leoas.


Na terra devastada,
Entre o sono e a vigília,
Contemplo a sombra esguia
Que se alonga como lança.


Enquanto o sol se deita
Atrás dos zigurates.
 

 

 

Tiziano, Mulher ao espelho

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Nei Duclós

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Michelangelo, 1475-1564, Teto da Capela Sistina, detalhe

 

 

 

 

Myriam Fraga


 

Outubro


Caroço de tempestades,
Nó de cobras ardentes,
Este é um mês de chuvas cálidas
E de ventos.


Subversivo ao calendário,
Fruto amargo
Na colheita ancestral.


É sempre outono
Em outubro,
É sempre vento.


Nenhuma cintilação,
Somente o escuro


E no escuro esta sombra,
Graciosa e febril,
Dançando à luz dos raios


— o canto áspero
E o pescoço
Carregado de contas.


É sempre guerra
Em outubro,
Sempre vermelho e azul.


Sempre pendões na ponta
Das estacas
Desse campo minado
A que chamamos destino.
 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Slave market

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Luiz Bello

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Plaza de toros

 

 

 

 

 

Myriam Fraga


 

Novembro


Agora Escorpião
Inicia a jornada.


Plutão na sétima Casa
E Marte, tão guerreiro,
Tão belo e protegido
Com seu elmo,
Seus encantos de macho.


Signo tão cruel,
Sorte tão vária,
A descida aos Infernos
E somente o princípio,


Lembranças guardadas
Como amêndoas,
Num frasco.


Vermelho é a cor da estrela
Que preside meus atos
— Uma parte é o brilho,
Outra parte o veneno.


Centelhas de ouro puro,
A dor,
A lâmina sobre a pele


E um gosto de romãs
E flores de jacinto.
 

 

 

Inocência, foto de Marcus Prado

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Erorci Santana

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Bathsheba,

 

 

 

 

 

Myriam Fraga


 

Dezembro


Na mesa do Natal
Duas velas acesas,
Fina luz verberando
O amarelo dos pêssegos.


Era contada sempre
A mesma estória,
Na sombra verde sombra
Dos pinheiros.


Uma estrela de papel,
Entre tâmaras e purpurina,
Apontava o caminho
Aos magos tutelares.


No pátio um leão vermelho
Quebrava nozes com as patas.
 

 

 

Albrecht Dürer, Mãos

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J. Romero Antonialli