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            Cláudio Aguiar 
   Três sonetos 
            metafísicos
 
   I
 Por que gostamos tanto do passado?
 A interrogante leva-me a pensar
 no segredo que fica em si guardado,
 que não sei se algum dia vou achar.
 
 Perdido na palavra ou termo dado,
 sempre o presente vive a deslizar
 em busca do impossível já pensado
 ou do que não se pode desvendar:
 
 os três instantes num sopro da vida,
 que poderia até vê-la esquecida,
 no que será ou já foi existente.
 
 O melhor é não mais perder o tempo,
 ainda que eu resuma num momento
 o passado e o futuro no presente.
 
 
 
 II
 
 Quanto mistério tem a flor guardado,
 pois, desde sempre, desafia a mente
 dos que desejam descobrir o dado
 oculto no desvão duma semente.
 
 E como o pólen nela está cravado,
 dele o áspide mau tira somente
 o venenoso, enquanto o mel levado
 por uma abelha logo se pressente.
 
 Quem tudo sabe pouco talvez veja.
 Quem nada sabe afronta sua verdade
 ou seu direito de bem percebê-la.
 
 Que o mistério segredo sempre seja
 para que nunca o mal vença a bondade,
 impondo a morte à vida sem querê-la.
 
 
 
 III
 
 Algo há nas flores que acalentam feras,
 chamando abelhas vivas do sereno
 para as tocarem, há perdidas eras,
 nunca alterando forma nem aceno.
 
 É preciso viver as primaveras
 para sentir o gestual e ameno,
 esforço feito, sol florindo esperas,
 elaborando o bom mel e o veneno.
 
 Há nelas algo que esconde o mistério,
 fazendo com que a abelha encontre o mel
 no mesmo pólen que o áspide tira
 
 o veneno letal, momento sério,
 grito de morte, do holocausto ao fel,
 que cega os olhos, apagando a pira.
 
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