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Soares Feitosa

Fortuna crítica

Neste bloco:

Adriana Bernardi

Aricy Curvelo

Beatriz Fernandes

Eloí Elizabet Bocheco

Helena Armond

Henrique Northfleet

Iosito Aguiar

 

Joaqum Alves

Jomard Muniz

Manoel Ambrósio de Q. Neto

Maria da Graça Almeida

Marina Almeida Chaves

Pedro Nunes Filho

Ruth de Paula

 

 

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Adriana Bernardi

 

Um primeiro escrito

 

Que lindo é "Adolescíamos", não? Que coisa... Outra vez a música de fundo o acompanha... como nos outros versos seus... mais suave talvez... mais lúdica... que bonito, meu amigo... que bonito!

Singelo... de um frescor lindo... quase reconheço a Mirtes perambulando, graciosa que só, nas ruas durante o dia... tantas Mirtes existem por aí, não??? Mas... ahhh... que lindo!!! Me trouxe de volta o cheiro da adolescência... os sonhos dali, já agora outros... os sons... o mundo ainda encoberto e por isso mesmo tão mágico... facinho, facinho de ser conquistado, né??? - risos - Êhhhh, Feitosa... mais uma emoção que lhe devo. 

 

 

Um segundo escrito

 

 

Feitosa... (ó eu cheia das intimidades...) 

E num é que teu mail chegou enquanto 'tava lá no jornal, procurando o tal artigo (que não encontrei!) do Beneticto Ferri? Desisti e fui seguir o roteiro que vc indicou... Descobri a origem do jornal... tudo bem... muio lindo... entrei na página 6 (página??)... e fui... fui... li FEMINA... me tocou fundo, uma coisa triste, quase uma inveja dela mode ser tão amada por alguém... "Convite a flor" me deixou meio boquiaberta... tudo bem... fui indo, fui indo...  de quem seria o próximo clic? Dou de cara com o "No céu tem prozac"... muito tempo tomando o comprimidinho prá num vê mais o céu cinza, né... fui lá ver o que era. E tou, com o coração na mão... os olhos cheinhos d'água... uma coisa doída... rapaz!!! Sei o que falar não!!! Num sei o que falá não!!! Obrigada, tá???

Adriana

 

 

Um terceiro escrito:

 

 

 

 

 

Maria da Graça Almeida

 
 
Dia frio,
do chocolate,
 o vazio,
da adolescência,
também.
 
Saudade,
calor que arde
 dentro de uma xícara
do laticínio
tardio.
 
Lindo!
 
Chego a perceber
os passos moribundos
da velha máquina
e, do outro lado,
bem cerzido,
o retrato da menina,
abotoado.
 
maria da graça almeida

Henrique Northfleet

 

Penúltimo canto, a dúvida

 

Mestre Feitosa, és também (como todos) homem impotente frente a verdade, esta resposta que, por certo, foi ouvida e esquecida. Teu poema, descobre o penúltimo selo, que jamais será entendido, apesar de nos ter sido revelado: como a palavra, que escrita, deixa-esvair-a-verdade. A verdade que, saida da boca, se forma do nada do ar (o roubar a idéia do ar!) e se perde mesmo na tua pena (ou no tão moderno teclado do computador) que garatuja o acontecido - com tua terra, com teu povo.

Penúltimo Canto, a dúvida?

Acredito que descreves, sim, a certeza, de que o „Novo Mundo“ perdeu sua cultura-mais-do-que-sua-inocência ao ter sido "descoberto".

Muito menos do que um canto apocalíptico, o teu poema nos revela a razão pela qual fomos expulsos do paraiso!

Mestre Feitosa, apenas numa coisa estás equivocado-por-modéstia: nem todos os outros poemas foram reduzidos a simples literatura posto que neste teu Penúltimo Canto o contradizes!

Um abraço

Henrique Northfleet

16.09.2000

Marina Almeida Chaves

O Menino Francisco José

 

 

Para compreender realmente a história que agora relato, é necessário que se conheça algo daquela criança, - dos nossos vizinhos, (o menino da contra-capa deste livro), lado esquerdo de nossa casa, em Monsenhor Tabosa, CE. - que conheci, quando ainda eu era bem jovem.

Fisicamente, não era um menino a ser classificado entre os mais belos. Mas a inteligência, a sagacidade na rápida compreensão das coisas, colocavam-no entre as mais atraentes. Jovens, adultos, todos dirigiam-se a ele com pilhérias, brincadeiras, só para ver suas reações e ouvir seus “repentes”.

Papai, já na terceira idade, homem solitário desde a morte de minha mãe, via em Francisco José, o nosso Soares Feitosa, agora poeta (certamente, sempre o foi, sem saber) a alegria de suas longas tardes, sentado na calçada, a cadeira encostada em diagonal na parede, ruminando o seu mundo de recordações...

Aquele menino, de coisa de uns quatro ou cinco anos, enchia de alegria as tardes de meu pai, e era como se ambos fossem dois velhos companheiros.

Dona Anísia, nossa vizinha, a mãe, dedicada, depositava naquele tesouro menino todas as esperanças de filho único; cabresto curto, temendo pela astúcia, trazia-o dentro de casa, portas fechadas, vestido num camisolão, sob a vigilância de uma pretinha - a madrinha Ana - que criara desde pequena.

E havia jeito? Francisco José era esperto demais para viver preso. E vez por outra, burlava a vigilância e fugia cauteloso, nas pontas dos pés, em direção ao seu reino, à calçada lá de casa. Era lá que ele tinha sua platéia, era lá que ele recitava suas trovas, pronunciadas com toda a clareza, com síncopes de letras e muita graça:

 

“Eu me chamo Quelemente,

nesta cadeira você se assente,

que eu lhe capo de repente...”

 

Do lado esquerdo de nossa casa, morava o menino Francisco José; do lado direito, a família Nunes, tendo a frente uma senhora, já idosa, dona Joaninha, que, por encargos do destino, recebera três inocentes crianças, suas netas, frágeis, mirradinhas, que choravam à noite com saudade da mãe, falecida de repente na cidade do Ipu.

Minúsculas as meninas, papai, carinhosamente as apelidara de as “Golinhas”, pássaros pequenos e bons de canto, menores que os canários.

As três gurias juntavam-se às outras da mesma quadra, toda tarde, na calçada e eram o prato predileto do Francisco José a quem todas temiam. Esclareço: ele não era um menino perverso; era brincalhão, presepeiro, o que é bem diferente... e divertido.

Pelo lado paterno, Francisco José possuía um tio-segundo, senhor Dionísio, um típico coronel do nosso interior, homem rico e poderoso, residente na fazenda Maravilhas, sertões de Tamboril. Era um homem temido, tido havido como o garanhão do trecho, importunando as mulheres que espalhavam sua fama de “perigoso” - um autêntico mito até hoje - e era chamado “véi Dioniz, Jumentão da Maravilha”.

Mães despeitadas ante a fortaleza e as astúcias do garoto, sentindo-se diminuídas pela timidez de suas crianças, chamavam-no, debochadamente de “Véi Dioniz”. O garoto ouvia tudo e, ele mesmo, sem que a mãe o soubesse, passou a cognominar-se, orgulhoso, de “Véi Dioniz”.

E numa tarde - lá se vão quarenta e tantos anos - lembro-me como se fosse hoje, lá se estava meu pai, com sua cadeira encostada em diagonal na parede, junto à janela, os pés apoiados nas traves da parte de baixo da cadeira, aquela mesma paisagem do pé de benjamim, absorto em seus pensamentos... As crianças tagarelavam tranqüilas, bem próximas... quando...

De repente, não mais que de repente, o rugido à porta, lado esquerdo, da casa vizinha, e surge, ligeiro e sorridente o prodígio-menino. De longe, já se ouvia o “currulepo” de suas alpercatas de couro macio, o camisão comprido ao vento... pára, chega-se à frente do seu grande “companheiro”, meu pai. O velho sorri, rejuvenescido.

— ôba, seu Pixico !

 

- olá, Francisco J

Vosé, você já viu as “Golinhas”. Elas estão bem ali, junto daquelas outras meninas.

O menino ouve atentamente, arregala os olhos, abaixa-se, arrastando o camisolão, num gesto felino de quem queria meter medo, engrossa a voz, e dispara em direção ao grupo:

— “Eu sou o véi Dioniz ! Eu sou o véi Dioniz !

Na calçada não ficou uma só para contar a história, correram todas apavoradas, trancaram-se dentro de casa, enquanto o velho ria às bandeiras. O menino volta vitorioso, porém esse prazer dura pouco. A pretinha guardiã, ao sentir a ausência do seu pupilo, apressou-se em procurá-lo no seu reino e lá o encontrou, escondido, atrás da cadeira do meu pai, naquela hora também cúmplice do mesmo folguedo. Levou-o sub-judice, ao corretivo da mãe, misto de carinhosa e de severa, severa em que procurava substituir o pai que Francisco José não conhecera.

Depois, tudo silenciou e voltou ao normal. Papai, ao seu silêncio... eu desisti de ficar à janela e entrei, como as “Golinhas” também tinham entrado de casa a dentro, carregando comigo algumas considerações - se dona Anísia ao menos sonhasse com o apelido que tinham posto no seu filho...

Mas, assim como meu pai, o que eu desejei naquele instante, era que aquele garoto rompesse outra vez a vigilância e retornasse, como se fosse mesmo aquele garanhão mitológico àquele espaço tão seu, alegrando as tardes frias e monótonas da nossa vila, com seu sorriso eufórico, aquele mesmo vigor extraordinário que ressurge pleno em sua obra poética da maturidade.

Hoje, passados esses anos todos, consigo visualizar perfeitamente aquele sorriso aberto, aqueles dentinhos miúdos, correndo de camisolão, desassombrado, pelas calçadas...

Ele e meu pai! Ambos. Dois meninos.

E em meus olhos já tristes, uma lágrima furtiva, do âmago de meu coração... daqueles tempos que os revejo inteiros na poética que acabo de ler.

 

Fortaleza, CE., hoje 02.07.94

 

Joaquim Alves

Penúltimo canto, a dúvida

 

Pronto, cá estou de volta para comentar este MAGNÍFICO poema-manifesto.
Pergunta-antes-de-resposta: porquê "penúltimo"????? Esqueça a minha pergunta, porque aí vai comentário!!!!! Viu?
O seu poema, uma vez mais, tem este ritmo frenético dos 18 anos! 
Sim, dos 18 anos. 
Também pode ser dos 20, para quem tenha nascido em anos 50 ou antes.
Continuo a ter esses anos - 18-20 - e é isso que sinto nos seus poematos.
Desculpe, nos seus superpoemas.
Onde é que a sua memória mora?

Sempre coisas boas.

joaquim alves, português da beira baixa
(interior de portugal-pequeno, mas muito belo!)


Beatriz Fernandes

Adolescíamos

 

Algumas coisas mudam: A névoa do chocolate quente agora é a fumaça do cigarro ou o ar poluído das cidades.... 

As mães trocam-se em pessoas barulhentas, maridos ciumentos, simples testemunhas inconscientes, Singer, a velha máquina - agora um piano, uma mesa um apoio qualquer. 

Outras coisas permanecem: olhar os cabelos, olhar os olhos, os gestos disfarces.... 

Caro Feitosa, adolescemos sempre. Mas só você consegue nos mostrar. Lindíssimo.

                             Bia

 

Ruth de Paula

 

Adolescíamos

Te descobri por 'adolescíamos'! Até bem poucas horas não havia  lido nada seu ou sobre você, nada; juro! Comecei a ler o jornal por sugestão de um poeta amigo meu, e de vez em quando via Pessoa, Adélia, Cecília, Ana Cristina César e Augusto dos Anjos.

Poxa, domingo, numa daquelas horas mornas foi quando li pela primeira vez um poema teu, Adolescíamos e aí... A forma como o poeta fala sobre o encantamento pela Mirtes e a intensidade do encontro é tão forte, cortante como a tesoura que serviu de adereço. Digo adereço, pois deixou a cena mais cortante, a paixão mais sangrenta, própria da adolescência.O verso que toca na relação olho/cabelo, cabelo/olho traduz o jeito especial de falar do corpo. 

Percebo também com alegria que você trata o feminino com o maiorconhecimento de causa, interessante isso! Não é muito fácil compreender o universo feminino; temos movimentos sinuosos, caminhos tortuosos, rimos da dor, choramos de prazer...

 

Helena Armond

         

        Um primeiro escrito

         

         

Adolescíamos

belo esse estar em duplo descobrir-se e não mais fechar se o tempo grava memória doce chocolate...cale-se jamais diria mesmo porque=

--------------------------

lúcida sem ilusão

ergo a taça de vinho

comemoro a vindima e a graça

que é a fermentação

 

desse estado a descobrir-se

----------

                                        helena armond

 

Um segundo escrito

 

Pedro Nunes Filho

 

O Cosmo, o Homem e Deus

Feitosa é seu nome de guerra. A primeira vez que o vi, achei-o um sujeito diferente. Fugia do padrão. Destoava. Era, sem nenhuma dúvida, uma pessoa incomum.

Conheci-o num seminário de tributaristas. De repente, levantou-se desinibido, foi para a frente da platéia, e deu seu recado de cearense que estava chegando no pedaço, sua opinião técnica de tributarista seguro e estudioso.

Repito: achei estranho aquele sujeito baixinho, quase gordo, cabeça-chata, linguagem original e sotaque de matuto que não se contaminara com os modismos vazios da cidade grande. Com toda franqueza, na hora em que apareceu, tive uma surpresa ante a interferência ousada daquele personagem incomum. Franzi a testa, olhei desconfiado, mas logo comecei a gostar do sujeito.

Seu linguajar de matuto bateu certinho com algo que havia dentro de mim. Eram raízes comuns, trajetórias semelhantes de menino pobre que foge para a cidade grande, sem nunca esquecer a cultura e a alma de seu povo, sem se desligar - e sem se envergonhar - de sua origem sertaneja. Aí soma uma cultura à outra e torna-se mais rico por causa da transitividade que tem em universos diferentes. É isso que Soares Feitosa é: o resultado da super- posição de duas culturas: a cultura simples do interior e a cultura erudita das bibliotecas! 

Dos sertões de Monsenhor Tabosa, Nova-Russas e Santa Quitéria, ele trouxe a cadência e toda a musicalidade que tornam seus poemas gostosíssimos de ler. De lá, trouxe também o vocabulário e, mais que tudo isso, trouxe um linguajar próprio das plagas sertanejas, daquele mundão sem fim, que somados à erudição resultaram numa plasticidade lingüística original e de rara beleza.

O que mais admiro nos poemas de Soares Feitosa é a capacidade de harmonizar o regional com o universal. Ele viaja, sem dificuldades, por universos bem diferentes. Quem faz uma análise superficial de seus poemas corre o risco de pensar que nada bate com nada. Ledo engano. Os gênios têm a capacidade de sair de um mundo e, de repente, entrar noutros completamente diferentes, buscando e mostrando um nexo, resgatando o que há em comum entre os lugares, as pessoas e os fatos, o que normalmente fica escondido aos olhos das pessoas comuns.

Percebo que os poemas de Soares Feitosa têm a mesma estatura. Todos nasceram grandes. Não há uma evolução entre o primeiro que escreveu (SIARAH) e o último que me trouxe quentinho (FORMAT CÊ DOIS PONTOS). Também não se repetem. Tudo é novo.

Pode até um dia se tornar repetitivo. Acredito que não. Poeta que não tem fôlego cansa logo, não vai muito distante. Soares Feitosa foi longe. É criativo, fecundo, seus poemas brotam com naturalidade e neles há profundidade e síntese nas idéias, um permanente confronto de culturas, valores e crenças.

Embora saiba que omnis comparatio claudicat, posso dizer que Soares Feitosa, conversando, lembra Zé da Luz. Escrevendo é um erudito. Apesar de partícipe da cultura do silêncio a que Paulo Freire se refere, consegue fazer um elo de ligação com a cultura dos homens letrados da cidade grande.

Mostra, sem intenção e sem pedantismo, que não há uma distância abissal entre as duas culturas, entre os dois mundos. O mundo dos que obtiveram o grau acadêmico e o mundo dos que aprenderam lições de sabedoria em sintonia com a alma do povo.

Lendo seus poemas, fica claro que tudo tem uma relação íntima, que há um ponto comum no Universo, porque a Realidade é uma só e o contato com ela é a Verdade. Em outras palavras, Soares Feitosa me fez entender que a Realidade não tem princípio nem fim. É isso mesmo, a Realidade é uma só; são diversas, porém, as formas como ela se manifesta no Universo.

Em FORMAT CÊ DOIS PONTOS, utilizando uma terminologia cibernética, o poeta percorre o KOSMOS, o ANQRWPOS e acaba chegando ao QEOS Universal. Enfim, os seus poemas mostram que o todo está em tudo e tudo está no todo!

O poeta, quando criança, aprendeu muito bem as lições de sabedoria do Padre-Mestre. Imagino que o Padre-Mestre era um homem que ensinava os meninos, não com palavras, mas com atitudes. Ensinava que a espiritualidade não é uma aquisição, mas uma evolução e que é próprio da divindade querer humanizar-se, para que o homem possa divinizar-se.

Há pessoas que vivem exclusivamente nas periferias, ignorando o centro; há outras que, fechadas no centro, abandonam periferias. Imagino que o Padre-Mestre conseguia viver na periferia e no centro, ao mesmo tempo.

Em Compadre-Primo e outras combinações da rara beleza, revela a singeleza da estesia lógica, bem comum no linguajar interiorano. 

Soares Feitosa fica me devendo uma coisa: um livro em prosa, não para pessoas eruditas, mas para gente simples ler. Um livro de memórias falando do menino que desertou para a cidade grande, deixando um mundo de sonhos e de ilusões para trás.

Um mundo de gente simples, com a alma plasmada na grandeza do sofrimento e do silêncio. Aí ele poderia falar novamente nos arreios de prata, no cavalinho Bacalhau, nos jumentos Moleque e Meia-Noite, nos gatos Mimoso, Zepelim e Banduco, na gata Xanduca, nos cachorros Rompe-Ferro e Foguete, na cachorra Biquara; no gibão de capoeiro... nos vaqueiros que povoaram sua infância, mostrando bravura na pega dos novilhos ariscos das caatingas, das queimadas e das bocas-de-serras dos seus sertões. Queria que Soares Feitosa falasse no cheiro da terra molhada, nas manhãs de inverno, na babugem que nasce com as primeiras chuvas do final das longas estiagens. Enfim, em tudo aquilo que os meninos pobres do interior abandonam para mudar seus destinos nas cidades grandes.

 

Eloí Elisabet Bocheco

 

PSI, a Penúltima, li de corpo inteiro, dobrando-me à força dessa peça genial que entra pelas células e chacoalha, açoita e tortura por ser tão maior que o meu olhar. É de uma beleza que dói, rasga por dentro. Format é riquíssimo, louco, abusado, ousado e estranho. Me assusta pra dizer a verdade. Me dá pânico pela grandeza que capto nesse seu texto. Você é um gênio. Nada há que se compare ao que você escreve. Você mudou a Literatura Brasileira e eu só posso é "cair de joelhos" ante a sua genialidade. Se você encontrar alguém que babe mais do que eu por sua poesia, por favor, não volte.

 

Manoel Ambrósio de Queiroz Neto

 

Soares Feitosa: ÆRE PERENNIUS

Um cometa das madrugadas puxado por um arcanjo desenha no céu sobre o mar um rastro de Poesia!

E sobre nós, chuva de luz, revela-se o invisível. 

Estrela nova convoca: tudo, todos! 

Veemência proclama o Hoje, docemente evoca as calendas da Infância... 

Fragmentos da vida, tênues fragmentos: cria, recria, vida, vida nova, expande o Mundo e expande para 
além fronteiras: Kosmos! 

De repente, impulso: Fire, Fire; intuitivamente: Fiat, Fiat, Fiat! e flui e jorra e arrebata! 

Ora cicia em brisa por entre a mata densa, ora, tempestade: verga, quebra, arremete ao frêmito e embriaga! Logo depois, qual chama, crepita e reduz a Pó: 

 

“...................................et in pulverem reverteris”  

Resurrexit contínuo, proclamas da vida: movimento, força, luz, cor, música! 

Onde ninguém jamais viu nada, ele vê tudo! 

Explosão, poema épico, odisséia: Siarah! Arrojo & glória!

Avenida dos pereiros, juremas pretas, unhas-de-gato, cardeiros, marmeleiros, feérica de pirilampos passeio de raposas fogosas (folguedos de quando chove) transfiguração beatífica no Pico do Caga-Fogo: Psi, a Penúltima! 

Megatons! Megatons! Trilhões, grilhões de megatons, nos dígitos, digitais: Format, Cê Dois Pontos!

Lello Universal: Bissetriz que nunca dividiu o seu mundo! “Ut omnes unum sint”: Padre-Mestre! 

Bólido de aço, touro bravio, Miura contra todos os muros, Tourada de sangue no domingo de maio, Cock-pit de dor, dor, dolor, doloris, a pátria de joelhos, Senna final: “Ayrton” 

Xará Francisco, o Brennand, o Domador do barro, das tintas e da emoção: o poeta viu o quadro: E se fez Sinfonia! 

Vara de Domador é arco de violino (ou de cello) também batuta de Maestro! 

Onde os músicos? 

Os ventos, as árvores, os pássaros, as formiguinhas, as joaninhas, os caracóis e os silêncios! O Domador é maestro, apurem-se os ouvidos aos sons da mata densa!

O cão não morde: leve sacudidela. 

Vamos, meu Maestro, afinaram-se os instrumentos. 

Erga a batuta: 

— TAN - TAN - TAN - TANNNN! 

É Ele, via Beethoven! 

A Quinta, d‘Ele!!! 

Iosito Aguiar

 

AS CARNAUBEIRAS DE CATUANA / EL AUSENTE

Tresmudando, queria dizer que tem coisas de que só um cearense é capaz. Pra viver naquela sequidão amando aquela terra acima de todas as outras, só mesmo sendo cearense ou árabe. Nunca poderia imaginar que o poeta cearense, meu querido capitão do mato, Soares Feitosa, tivesse o despautério de colocar-se, literalmente: por cima e por baixo, do grande mexicano Octávio Paz! 

Que todo cearense é meio doido, tô cansado de saber. Não só Soares Feitosa se colocou num poema “repleto de enigmas e tentativas de decifração”, no dizer de minha conterrânea e, provavelmente, parente, Regina Sousa Vieira, que pertence à ilustre casa dos Sousas, descendentes diretos do Barão Henrique Antunes de Sousa Neves – que na Bahia era dono das águas – e dos Vieiras (donos das terras) aos quais pertenço que, além de heróis de Alcacer-Quibir, à pedidos de D.João VI, introduziram o cultivo da cana-de-açúcar na Bahia, adoçando assim o Brasil.

Continuando a falar do capitão Soares Feitosa, no seu Jornal de Poesia, o homem nos apresenta uma ANTÍFONA tonitroante, esbanjando uma absurda riqueza de recursos. Com toda a nonchalance de que só um cearense da molesta é capaz, o capitão apossa-se da Midraxe – ciência dos escribas árabes – que é um modo de contar, escrever ou declamar, acrescentando aos fatos a experiência pessoal e, como se isso não fosse o bastante até porque é um leitor contumaz das escrituras sagradas, nosso estimado capitão usa e abusa do Halacá e do Hagadá, recursos privativos de santos e sábios rabinos para explicar, comentar, enfeitar e ampliar os efeitos de seus versos, ao lado dos versos do venerável Octávio Paz.

 

Aricy Curvelo

 

AS CARNAUBEIRAS DE CATUANA / EL AUSENTE

Feitosa, 

Quem falou em ausente? Entre o antes do início e o depois do fim do poema de Octavio Paz acontece o poema de Soares Feitosa.

Um artefato de simultaneidades entre a voz íntima que procura se concatenar, tateando nos versos de Paz,  e a paisagem noturna que deslisa fora, ao longo do carro. Na dia/noite do falecimento do grande poeta mexicano se inscrevem os vigorosos versos do brasileiro  "aos padecentes do silêncio" ("quem falou por eles?"), "num horizonte em disparada" na Rodovia Catuana à noite, na "noite erma", após  a morte e o mais que brotam dos versos do mexicano, a quem  parecera que: "...Dios que al silencio del hombre que pregunta contestas con un silencio más grande, / Dios hueco, Dios de nada, mi Dios..." afinal também "Dios de resurrección", embora "Dios vacio, Dios sordo, Dios mio", "forma terrible de la nada" 

Nos cortes simultâneos do pensamento e da paisagem veloz, a copa belíssima da carnaubeira se ergue como um ostensório em prata e brilho. O ostensório, metáfora que evoca o sangue de Christo, por meio do qual todos os crentes aguardam renascer, lembra que não há a morte. Don Octavio responde: Presente! 

 

Jomard Muniz

Mapa da navegação em Soares Feitosa 

 

Navegar é co-possível 
Cópulas de recriação
Entre vertentes e mares
quem o segura?

Soares, errante navegante
A quem prestam contas os galos?
Numa manhã de abril
Cópulas de circunavegação

Auroras: nudez dos teus olhos
Navegar é sempre possível
Cúmplices da poeticidade
Numa noite de março
Abismos. Abismos!

Continua

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