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Soares Feitosa

Fortuna crítica

Neste bloco:

Antônio Houaiss

Ariadne Quintella

Ascendino Leite

Astrid Cabral

Beatriz Escórcio Chacon

 

Bráulio Leite Jr

José Santiago Naud

Luiz Augusto Cassas

Luiz Bello

Luiz Cláudio de Castro

 

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Antônio Houaiss

 

Um primeiro escrito

 

 

Retardando numa recuperação de saúde que me está sendo uma verdadeira ressurreição, recuperando-me de dupla catarata recém operada, quero agradecer-lhe Psi, a Penúltima, que já me intrigou e instigou o bastante para gastar-lhe tempo de lê-lo com vagar.

Veja o original

 

 

Um segundo escrito

 

Esta é a segunda reação ao seu Psi, a Penúltima, que está sendo justamente recebido com entusiasmo, conforme estampado nas orelhas do livro. Estou certo de que as confissões autobiográficas  tiveram um poder de peso ponderal  à reação dos leitores, que, como eu, sentem que os poemas dizem nos limites de sua vida mais do que os limites permitem — o que é o forte de sua obra. Sinto com relação aos poemas de versos curtos, às vezes curtíssimos, que o fundo ou o lastro poemático lhes falta, o que será dado pela sua própria alocação  — no que você associa bem os poemas escritos aos poemas falados, a sua literatura de oratória:  você acabará editando alguns discos (CD) com os últimos. 

Reavivo-lhe meu agradecimento e espero que prossiga na sua trajetória.

 

Um terceiro escrito

 

Seu Salomão, pré-edição, confirma-o como poeta em prosa e verso. No verso, acompanho os louvores que lhe foram feitos pelo Psi, a Penúltima. Na prosa, prosaverso, você é destemido, corajoso e positivo, porque humanitário. Lamento que minhas letras se enuviem quando quero louvar. Perdoe-me, mas louvo-o.

 

Ariadne Quintella

Palavras, vazios, sinais. Signos e simbolismos. Idéias. Estes elementos estão presente na poesia de Soares Feitosa, que em diferentes momentos desloca-se no espaço e se aproxima do romanceiro, que moldou a expressão poética ocidental.

Foi aos 50 anos que esse autor despertou para a literatura, através da poesia. Nela, o cruzamento de imagens que após passar por um demorado processo de maceração, brotaram de repente sem que o autor se apercebesse.

Não importa buscar qualificacões para a composição poética de Soares Feitosa, ou ter preocupação de encaixá-lo entre os poetas concretistas. Oportuno mesmo é descobrir o que se esconde lá dentro, numa miscigenação de idéias quase sempre carregada de simbolismo e que revela os seus valores.

O corpo da Mãe Terra, como diria Millie Uydert, está vivo e foi construído segundo o mesmo padrão cósmico do homem que ela carrega no colo. E foi justamente essa energia telúrica, capaz de criar os verdadeiros artistas, que impregnou o espírito de Soares Feitosa, fazendo-o retroceder, em determinados momentos, ao seu pé-de-serra, escondido no mapa do Ceará.

Importam as distâncias se a vida é a mesma em toda parte?

Daí ele fazer o contraponto entre o sertão onde nasceu e a Grécia para onde é levado pela mesma estrada. Os deuses do Olimpo ocupam seu imaginário ao lado da raposa, esquálida, cinza, fulva, até do sibite que é nosso compadre e tem filhos para criar.

O autor nos conduz por ravinas, malocas e locas, tocas, ocas e precipícios, onde é comum a presença de espinhos, garranchos e pedregulhos. Numa linguagem rica em metáforas, a poesia de Soares Feitosa também é uma denúncia, embora aquele jogo de palavras seja, aos olhos do leigo, ilógico. Na figura dos engodos e das esperanças, do sofrimento e da resistência, das desigualdades sociais do urso panda e da raposa, o primeiro alimentado a pires de leite e nectarinas e a outra, vítima de perseguição no Maciço do Baturité onde a água, quando aparece, é sempre música e a comida é pouca para dividir com os bichos.

Apesar da adversidade, sobrevive a resistência do homem nordestino nos versos soltos de Soares Feitosa, porque fugir não é destino. É fugaz alternativa do ficar e lutar.

Depois, quem pode escapar do estigma de ser nordestino, baiano ou paraíba ? A resistência do autor foi forjada muito cedo e alimentada pela luz do sol que ofusca de brilho esta região. Por conta disso, ele não despreza as papas de farinha de trigo que comeu, a carne de bode, a coalhada e os cheiros e sons da infância. A lagartinha removeu lentamente as dunas e fez desmoronar tudo, mas Almofala é a cidade ressuscitada pela mesma lagarta que habita o imaginário do poeta. Ali hibernam as primeiras inquietações da adolescência num universo de sortilégios e onde a inspiração vagueia do tema lírico ao filosófico, para fazer valer a força da palavra que desabrochou em verso.

Mas, como diz o próprio poeta, nada é último, só Ele quando voltar, resta ao leitor aguardar e ver que esta edição não seja definitiva.

 

 

Luiz Bello

 

Um primeiro escrito

 

Penúltimo Canto

Penúltimo Canto — onde há perigo, há medo. O medo produz a angústia. A angústia inspira os poetas. E desencadeia poemas como Penúltimo Canto, rajetória entre uma pergunta inquieta e a revelação final do perigo de saber... Como no Gênesis, no princípio era o Nada. Depois veio Sócratas, o primeiro a perguntar: "Que é a verdade?" Platão tentou responder a pergunta ao mestre: A verdade é apenas um ponto de proporções infinitesimais e consistência imaginária, mas valorizado, ou supervalorizado, pelo fato de se encontrar precisamente na metade do caminho entre duas dúvidas ou duas certezas possíveis. Um poema que flui, baila e galopa ao longo de marcos miliários distribuídos por Pound, Sócrates, pensadores bíblicos e até o anônimo redator de um sábio manuscrito do Mar Morto, tem alpiste suficiente para alimentar todo um viveiro de pássaros intimidados. 

E substância bastante para aspergir, sobre o meio em que brotou, a água benta amigável de uma mensagem decodificada. Cal, virgem, quando ferve na água e no verso de um artista sensível, convida à reflexão Perguntas sem respostas provocam erudição. Malherbe ensinou a dizer "Et les fruits passeront la promesse des fleurs" O Penúltimo Canto exibe, mesmo a Primavera de uma geração de poetas como Soares Feitosa, com suas flores literárias cultivadas entre perguntas e temores de uma promessa concreta de respostas musiciais, delicadas, envolventes e instrutivas.

 

Um segundo escrito

 

Psi, a penúltima

Vulpes ad poetam: no ensaio "O Castelo de Axel", Edmund Wilson, um dos mais atentos críticos literários do seu tempo, identificou e classificou duas correntes no movimento simbolista dos anos trinta. A uma dessas correntes, Edmund Wilson deu o nome de "sério-estética" e descreveu como voltada para a expressão refinada dos sentimentos, a musicalidade e a abstração das idéias. À outra corrente, Edmund Wilson deu o nome de "coloquial irônica" descrevendo-a como tendente a unir o humor risonho ao amargo em estilo convencional. 

Psi, a Penúltima, um poema que provavelmente todos apontarão como a obra-prima de Soares Feitosa, ajuta-se muito bem à segunda corrente descrita por Wilson, o "coloquial irônico". Vincula-se com naturalidade ao gênero do humor e da crítica bem humorada e smiultaneamente, ou eventualmente, também exerce a crítica amarga. 

"Psi" incorpora o diálogo entre uma raposa nordestina, flagelada pela seca e marcada para morrer — e um poeta quixotesco empenhado em verberar a prepotência implícita numa campanha oficial de extermínio aos transmissores da hidrofobia. Ao longo desse diálogo, o poema percorre diversos itinerários da ficção poética, para ser, gradativamente, solene ou grave, sublieme ou patético, dramático ou cômico. Para qualquer crítico, de qualquer escola ou tendência literária, esse poema dá o que pensar, porque une um passado remoto — Esopo, Fedro, La Fontaine que é precisamente o traço de união entre todas as raposas da literatura milenar e a intimidada "Comadre”, destinada a acrescentar ao perfil de Vulpes um novo traço: o da fúria atemorizante, gerada pelo desespero. O poeta é evidentemente um estudioso, erudito, mesmo, demonstrando, no seu papo coloquial-irônico com a Comadre, que a nossa  mente não é uma estante de biblioteca, onde se acumulam como depósitos de conhecimentos. Nossa mente é uma central de comunicação com toda a humanidade, e um poema — um grande poema, como "Psi", — deve ser precisamente, um dispositivo de comunicação entre as mentes capazes de sentir a poesia. Em face de poemas assim, nosso cérebro costuma atuar como um aluno atento, disposto a reagir e valor cada excitação.

Hoje, como sempre, um grande poema pode surgir, ou ser criado como um relâmpago de inspiração que nos ilumina e engrandece. Mas o ofício do poeta continuar a exigir tempo para sentir, tempo para contemplar, tempo para acender e transmitir a centelha, o ensinamento límpido e contagioso que traz consigo as sementes do conhecimento estético. A erudição aplicada em "Psi", inclusive com a adoção de notas explicativas, enriquece o poema e o fortalece para lutar — e vencer — a difícil luta da verbalização.

A poesia legítima penetra, mergulha nas profundidades do espírito, vai até onde repousam nossas aptidões inconscientes e pode despertá-las com súbita e magnífica energia.

Tucídides comprovou sua genialidade de historiados, depois de absorver uma obra de Heródoto. Sófocles descobriu o próprio dom de filosofar, durante a leitura dos manuscritos de Demócrito. La Fontaine só acreditou na sua vocação poética, depois de ler uma ode de Malherbe. E só depois de estudar minuciosamente as fábulas de Esopo, Fedro e La Fontaine, Soares Feitosa — o autor de "Psi, a Penúltima" — ousou divulgar seu maior poema, mensagem aliciante, de leitura indispensável para quem ama a poesia.

Quem lê "Psi, a Penúltima", desvenda Soares Feitosa.

Ele esculpiu sua fisionomia poética sobre contrastes e assimilações. Se por ventura ainda lê muito os autores de sua época, com certeza os submete ao crivo de sua mentalidade clássica. Pois a mentalidade clássica revela-se como o impulso construtivo de poemas maiores como "Psi". Em contraste, Soares Feitosa usa o conhecimento dos antigos com mentalidade moderna, por isto mesmo renovadora.

Para os poetas assim dedicados à constante valorização dos próprios conhecimentos, a poesia não é mero passatempo, mas um poderoso aliado nas indagações do pensamento.

Saboreando poemas como "Psi, a Penúltima", compreende-se, com alegria que o Jornal de Poesia já principiou a cumprir sua gloriosa predestinação que é a de revelar e apresentar ao mundo lusófono os talentos que emergem da obscuridade para o pleno usufruto da admiração que merecem.

 

 

Um terceiro escrito

 

On line:

 

Kant afirmou, certa vez, que não saberia ensinar a ninguém o que era Filosofia, mas saberia ensinar a filosofar. Ninguém me ensinou a fazer Poesia, mas eu encontrei uma definição: Poesia é tudo aquilo que me emociona! Há duzentos anos, quando eu vim parar no Piauí, achava engraçado o povo dizer que um céu chuvoso estava "bonito". Foi a minha primeira lição de poesia-adquirida, porque, com o tempo, eu mesmo olhei para um céu de aguaceiro e achei que estava bonito. Fiquei emocionado. E aprendi. Nada a ver com o belo-horrível. A expressão "bonito pra chover", tão comum aqui e tão estranha para o ser que eu fui, de fora, encerra uma beleza que está nos prognósticos implícitos e uma sabedoria que os meteorologistas não dominam, mas poetas sim.

Seu verso despretensioso "gotejava o inverno" identificou-me com sua inspiração, revelou-me a naturalidade do seu estro e afirmou-se (só para mim) como algo ainda mais instrutivo — e certamente mais sentimental — do que as mãos, a noite e o teclado de que você fala como quem ainda não sabe que talvez seja capaz de ensinar alguém a fazer, com a Poesia, o que Kant não se atrevia a fazer com a Filosofia. Como todo poeta legítimo, você, SF, tem um destino: emocionar e ensinar.

 

Luiz Cláudio de Castro

A poesia de Soares Feitosa

Infelizmente, não sou crítico literário nem tenho pretensão de criticar o ensaio Os Poemas da Besta. Digo apenas o que senti. Vi um novo Apocalipse dentro de um escrínio de ouro. Li e me embriaguei de beleza e de verdade. Maravilha o simbolismo entre o estábulo do Menino-Deus e as maternidades que fizeram holocaustos de criancinhas ao Anti-Cristo, já nascido, acho eu, e andando por aí. Não há mais tempo, mesmo!

Thiago: conheci Thiago quando, ainda jovens, trabalhávamos no gabinete do cearense Parsifal Barroso, Ministro do Trabalho, de então. O Secretário do Ministro era o meu colega de Seminário, Hesídio Facó, o mesmo Hesíodo de quem falo em O dia da Ira,  e homenageio, em memória, em Gogó de Sola. Voltemos ao Thiago. Quando anos depois, em perigrinação, passei pelo ninho antigo, procurei Thiago. "Fugiu para o coração da mata, para produzir poesia"— foi o que me contaram. Barreirinha é um nome que sempre andou de bubuia na minha lembrança. Foi onde tia Belinha viveu com o marido dela, Farias, ainda na minha infância. Fazendo o quê? Francamente, não sei. O nome entra, em curta referência, no romance que estou escrevendo e será, salvo melhor escolha, Covão dos Sonhos.

De novo, os grandes Poemetos. O conteúdo de Thiago, que você me assinalou ao telefone, e lhe sou gratíssimo, mastiguei suave e gostosamente. E ainda volto a ele com o mesmo apetite. Afinidade, o cheiro da terra, eis a questão. Antes, contei-lhe os constrastes vividos no nosso Siarah, para bem destacar o sabor encontrado ao ler Thiago. Meus olhos se assombraram quando li:
 

"Comuns de nós

a ancestralidade das águas desejadas,

minhas,

escassas, sofridas, minh’águas;

enquanto as tuas, Thiago,

são as águas dos silêncios,

talvez reparações de alguma

reforma inconclusa

do dilúvio primevo".

 

Daí pra frente, Feitosa, foi aquele banho de cascata, como o que tomou, num verdadeiro Eden, o seminarista de O Dia da Ira. Quando cantas:
 

"...que as águas dos teus rios, maiores que sejam,

jamais encharcariam estas terras secas,

terras que foram feitas para se irrigarem 

— tão somente quando daqui fugimos —

...

nos

olhos 

das que 

ficaram.

 

Lembrei-me da mulher e dos filhos do João (Gogó de Sola), deixados por ele no sertão. E me emocionei profundamente. Para depois rir comigo mesmo dos "gritos plangentes dos macacos-pregos". Sabe por quê? Parecei doideira, mas não é. Veja bem: eu criança no castanhal da Tia Joana, impressionado com os gritos dos macacos, perguntei ao caboclo Cecílio o porquê. 

E ele: — Os macacos quebram os ouriços de castanha, enganchados no galho da árvore. Vez em quando acertam no preguinho deles.
Para concluir, conterrâneo Feitosa, até na "vastidão terçã", fugindo e voltando, como aqueles pés que emigram e povoam (Demócrito Rocha) encontrei paralelos sinais dos meus personagens in Gogó de Sola. A febre terçã maligna da borracha, no Desengano, onde você também, Feitosa, deve ter peregrinado agora.

 

Beatriz Escórcio Chacon

Soares

Recebo seus poemas — óleo, incenso, sensibilidade em mim derramados. Do meu viveiro mando mudas feito abraço, que semente me vieram num sopro. Guardo cá entre folhas pra toda estação e caminho. 

Obrigado, Poetamigo, 

Inspiração, sempre!

 

Bráulio Leite Jr

O Nogueira, meu com e ilustre amigo, dr. Luiz Nogueira Barros, trouxe-me de presente o livro Psi, a Penúltima" - Edições Papel em Branco, do poeta Soares Feitosa. Um para mim e outro para o nosso amigo Arnoldo Jambo, que tanta fez às Alagoas durante um périplo de quase 30 anos.

Confesso que não conhecia nada desse iluminado cearense. Ou melhor, quase nada. Tinha ouvido alguma referência, sim, do próprio  Nogueira, quando me falou que o conhecera na Internet. Apenas uma menção não fixada, mas que aflorou tão logo o recebi o livro, senti o perfume das sementes de imburana, encabulei com o título e li alguns trechos em voz alta, num sábado de descanso aqui no Sítio Velho. Os presentes aplaudiram, quiseram saber, comentaram, cheiraram, abriram e reabriram o livro, entre muitas diversas opiniões. Depois que todos saíram, levei "Psi" para o meu quarto. Lá pelas tantas, madrugada alta, costume, acordei para ler. E o livro ali estava como se esperasse por mim.

Comecei a leitura, fui tomar café com ele debaixo do braço e outra coisa não fiz durante todo o dia. A poesia de Soares Feitosa me fascina, fazia refluir meu sentimento de menino nordestino, revivendo paisagens, ruídos e cheiros perdidos nas andanças de tantos anos... Uma cancela batendo no mourão, o rangir da rede no terraço da casa de meu pai, o mugir da vaca parida atraindo o bezerrinho de pernas inseguras, o correr das águas despencando nas pedras ou vale separando serras e montes, exibindo touceiras de capim "sempre verde" e de flores do campo. Mulher vestida de chita nas festas de São João, as advinhas, o dizer e os anseios do povo da "oropa, frança e bahia", o cheiro gostoso das frutas maduras e das comidas do interior.... A saudade dorida dos que foram e dormem profundamente... Lendo, percebia um universo múltiplo, popular e erudito, versejado e comentado em idioma próprio, particular e universal, como só os poetas sabem criar e oferecer. Ao mesmo tempo, vale prevenir, dificilmente alguém não se surpreenderá com a arte de Soares Feitosa, principalmente um neófito como eu, se não ler e reler com atenção o que ela contém, "no seu estuário poético, fragmentário e composto ao mesmo tempo, com suas vozes numerosas movendo-se entre os horizontes de vários passados e o espaço experimental de vários presentes", como analisa o nosso poeta Lêdo Ivo. Ou então, como diz Jorge Amado: "Seu livro é como uma dessas arcas de antigamente, onde eram recolhidas coisas diversas, cada uma delas com sua importância e significação."

A verdade é que no outro dia já, manhã clareando, eu relia Réquiem em Sol da Tarde, surpreendido por Edna, que me observava, livro nas mãos. faces molhadas, emoção arrebentando o peito. Pediu-me para e lemos juntos:

Sim, 
a porteira do caminho do rio
ainda era a mesma.
A direção do rio também; 
presumo não tenham mudado o rio.

O benjamim, 
disseram, morrera na Seca do 93;
arrancaram-no pelo tronco.
Não replantaram sombra, 
nem pássaro.

 

O banco de aroeira, 
racharam-no em lenha de fogo.
O curral das vacas,
também.
 

O chiqueiro das ovelhas, 
à esquerda da casa
e o dos bodes, 
à esquerda do das ovelhas,
sumiram todos.

 

O batente da porta-da-frente, 
e abaixo dele, outro batente,
onde uma pedra,
com um caneco d'água 
lavei os pés,
ainda estão lá,
os batentes;
e nos batentes também estavam
meus rastros em riscos de fogo,
que continuam.

 

Os canários amarelos, 
os mofumbos florados,
não os vi;
nem Flor... 
que também não vi.

 

Os armadores da rede,
na sala-da-frente, sim, 
estavam no logar,
parecem outra vez prontos para rangir.

 

E daquelas pessoas, 
quando perguntei por elas,
fizeram-me um gesto distante.

 

Perguntei por mim;
ningúem sabia quem era.

 

Eu disse: 
é um conhecido meu que gostava muito
daqui.

 

Perguntaram-me quem eu era.
Um amigo, disse,
e fiz um gesto
ao tempo.

 

Ficaram sentidos por não saberem
nem de mim, nem do "outro".

 

Um menino pequeno começou a gritar, 
lá dentro.

 

A mãe correu 
para acudir.

 

Despedi-me 
sem dizer palavra.
 

É isso aí. Bonito, não acham. (Gazeta de Alagoas, 14.05.97)

 

Luiz Augusto Cassas

Soares Feitosa

 

Você conseguiu tornar amplo o paradoxo da criação: universalisar. 

Sua poética lembra Gerardo Mello Mourão e Manoel de Barros, mas no que eles têm de telúrico, já que você é árvore ímpar platado no chão adubado da poesia. Um caso raro de provincialidade não provinciana. E isso é tão raro, caro e perigoso - parabéns!

 

Ascendino Leite

Meu caro Soares FeitosaAscendino Leite

 

Que poeta você é! Basta para comprová-lo esse admirável Femina que assinaria lavado de emoção e de alegria.

 

Ascendino
 

José Santiago Naud

Caro Poeta Soares Feitosa

Fico muito feliz, companheiro, de que as melhores vozes nacionais, viradas para a Poesia, reconheceram e proclamaram sua energia lírica, quantas vezes de ressonância épica. 

E, sobretudo, sua afeição à terra, tão originalmente expressa na singularidade desse envelope peregrino com cheiro de imburana, numa prova de que a Natureza e Vida lhe garantem a seiva na forma da palavra! 

Continua 

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