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Natalício Barroso


 


Fortuna crítica: José Alcides Pinto

Natalício Barroso: o poeta da ficção

 

 

Comecemos nossa análise crítica do livro de Natalício Barroso - Novelas reunidas (Fortaleza, Premius Editora, 2002), dando uma visão objetiva de sua sensibilidade criativa na prosa de ficção. Não se trata aqui de um livro de alcova, nem de simples estórias bem contadas de começo, meio e fim, com personagens dentro do figurino tradicional, com heróis estereotipados, marcados pela fatalidade do destino.

Os fatos aqui narrados têm a caracterização própria dos aventureiros, daqueles que trocam a vida estável pelo perigo, pela ação, pela descoberta, como acontecem aos velhos marinheiros solitários, que navegam por mares desconhecidos e imprevisíveis. É assim que Natalício Barroso constrói seus livros — As Novelas — fugindo do comum do que até então tem sido o prato cheio de escrevinhadores de mesa de bar.

O que ele publicou no rio (teria sido pouco?) foi o bastante para mantê-lo na lembrança daqueles que sabem separar o joio do trigo. Estamos diante de um autor diferente, rico de idéias e motivações, e que sabe contornar os rodeios por onde caminham seus personagens. Um livro é bom quando incomoda o leitor pelo assédio da trama, a caracterização dos personagens e o desafio que se levanta do texto, desarmando-o, forçando-o a procurar a porta de saída, já que ignora a porta por onde entrou.

Nesse ponto autor e leitor acabam cúmplices. Ambos são agora partes indivisíveis e indisfarçáveis. Assim as Novelas de Natalício absorvem nossos pensamentos, confundem nossas idéias, excitam os pesadelos de nossa mente, e não podemos mais largar o livro senão depois de acabado, quando nada mais nos resta fazer, a não ser tentar inutilmente desvencilharmos do sonho do fantástico que ficam girando em nossa cabeça.

Natalício é um autor que tem sua marca pessoal inconfundível. E isso é importante para o intelectual que se preza.

A verdade inusitada e revolucionária de suas novelas — Viagem sem fim, A triste sina do Imperial, A casa de Gustavo e Cartas de Pilos — mostra a autenticidade de um criador sui generis, que continua intatcto em seu modo de ser e de se mostrar ao mundo através do que escreve. O tempo aqui não abriu fendas, muito ao contrário, serviu para a aferição dos elementos estetizantes de sua obra.

O escritor cearense porta uma linguagem (metalinguagem) que se identifica, por exemplo, com Clarice Lispector, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, João Antônio, Murilo Rubião e poucos outros. O elemento novo (forma-estrutura) está sempre presente nos lances dramáticos que são os sustentáculos de suas narrativas. A completa liberdade de ação dos seus personagens, nos remete ainda aos grandes escritores de nosso tempo.

Natalício Barroso é um escritor consciente do que faz e onde quer chegar. Não lhe apraz o elogio fácil da crítica, prefere a análise interpretativa de profundidade. É esta que projeta o autor em comunhão e igualdade com os demais de sua época.

Mas para que o leitor não saia do livro de mãos vazias, damos pequena mostra de o que se acha na contracapa das Novelas, o que dá uma visão meridiana de seu potencial narrativo.

“Fosse eu um poeta, escreveria um poema no qual este mar sem ondas e sem espuma — o Firmamento — onde nadam as estrelas, terminaria. Ali, se pudéssemos aportar e atracar o nosso navio, talvez pudéssemos ver coisas maravilhosas — mais maravilhosas do que os mortos — vivos — e estarrecidos diante de nós”.

Entendo que o melhor crítico é aquele que “foge da obra” para melhor identificá-la em seu todo plural e substantivo.

Natalício Barroso é um criador de símbolos e mitos.
 


José Alcides Pinto
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