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Helio Fernandes

 

 

Leighton, Lord Frederick ((British, 1830-1896), Girl, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Riviere Briton, 1840-1920, UK, Una e o leão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Caravagio, Tentação de São Tomé, detalhe

 

 

 

 

Helio Fernandes


 

GMM, o combatente intelectual

Gerardo Mello Mourão merece mais do que um obituário ou de qualquer outra palavra. Não precisa de louvores ou reconhecimento. Conquistou tudo isso em vida, e que vida. Combatido e combatente em duas ditaduras, na primeira passou 6 anos preso, sem culpa, sem julgamento e sem sentença. Na outra, preso várias vezes e novamente cassado, começou suas andanças pelo mundo, como exilado, caminhadas que completaria depois como correspondente.

Como outra grande figura que foi Osvaldo Peralva, Gerardo foi correspondente da Folha, em vários países. E aprendia a língua, não tinha necessidade pois suas matérias eram obrigatoriamente escritas em português. Mas fazia questão disso, falava holandês, chinês, latim, grego e os rotineiros francês, inglês, espanhol e italiano, correta e correntemente. E que cultura acumulou durante toda a existência.

Simples e despretensioso, Gerardo não tinha o mínimo de arrogância, nem tentava mostrar superioridade sobre ninguém. Mas essa superioridade se apresentava naturalmente, era impossível desconhecê-la ou segregá-la do dia-a-dia. Sua convivência, prazer e satisfação.

Posso dizer sem a menor hesitação, que foi um dos maiores intelectuais do seu tempo, da mesma forma que Roland Corbisier, com quem travou grandes debates. Acredito que não tenham sido gravados, na época a tecnologia era inteiramente "mecanizada", não era voraz e dominadora como hoje.

A propósito é preciso lembrar que na sua fase de correspondente, além de buscar a informação era preciso cuidar da transmissão. Não é como hoje que com um simples lap-top, a matéria chega à redação exatamente no momento em que é escrita. Como se fazia naquele tempo? Principalmente de um país distante de tudo como a China, que voltou a resistir depois de 1949, quando Mao Tse-Tung, na sua Marcha Histórica, tirou a China do seu sono do Século X para colocá-la imediatamente no Século XX. (Mas isto já é outra história).

Impossível contar em poucas notas ou lembranças a vida dramática de Gerardo Mello Mourão. Em 1940, preso arbitrariamente pela mais terrível, trágica e criminosa ditadura que foi a do Estado Novo, foi condenado pelo Tribunal de Segurança Nacional, que era o que existia na época. O procurador geral que comandava esse tribunal de exceção, se chamava Hymalaia Virgulino. Não era um nome era uma maldição.

Gerardo ficou preso 6 anos, a ditadura foi derrubada em 29 de outubro de 1945, logo em 1946 o Supremo Tribunal Federal absolveu Gerardo por unanimidade. E nessa humanidade, basta citar o relator e o revisor: Ribeiro da Costa e Nelson Hungria. Na outra ditadura que começaria em 1964, Gerardo foi novamente preso, cassado, exilado.

Gerardo Mello Mourão era e será sempre um notável intelectual. Só a Academia, num dos seus costumeiros equívocos, recusou eleger Gerardo Mello Mourão, que não devia se candidatar, era obrigatória a sua convocação. Sobraram poucos do tempo da recusa em aceitar Gerardo como imortal. Agora não dá mais tempo, mas a Academia, como instituição, jamais se livrará dessa derrota, pois é de derrota que estamos falando.

Gerardo escrevia muito bem de todas as formas, era também um poeta excepcional. Mas se conversasse com um gravador ligado, teria deixado muito mais, pois suas conversas eram aulas simples e profundas, e o próprio Gerardo não percebia isso. Mas era inesquecível para os que falavam sempre com ele.

PS - Não choro a morte de Gerardo, todos temos mesmo que morrer. Até mesmo os países morrem todo dia, como aconteceu nestes dias com o Brasil e a visita do ditador Bush. Mas Gerardo lutou pela vida da mesma forma como lutou contra a morte.

PS 2 - Em uma época, fui muito amigo de seu sogro, senador Barros Carvalho, que tinha notável pinacoteca. Adorava seus quadros, mas sempre desconfiei que adorava muito mais a cultura do genro. Era um homem de bom gosto.

[Tribuna da Imprensa, 12.3.2007]


Direto para a página de Gerardo

 
 

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