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Cristine Gerk 

 

crisgerk@gmail.com

 

Thomas Cole (1801-1848), The Voyage of Life: Youth

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Poesia:


Ensaio, crítica, resenha & comentário: 


Fortuna crítica: 


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  • Nota biográfica

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Alvaro Seiça Neves

 

Thiago de Mello

 

 

 

 

 

 

 

Andreas Achenbach, Germany (1815 - 1910), A Fishing Boat

Cristine Gerk


 

Segura o Vento

Você anda por uma rua
Chega o vento, de repente
Você se abriga, espera ele passar
Agora, tenta segurar o vento
Tenta...
É impossível fazê-lo parar

Você pega a cola do sapateiro
Que tudo cola, tudo pode colar
Agora, tenta colar a sua alma
Que se despedaça sem pedaço
Impossível remendar

Você usa binóculos de vidro
Que prometem fazê-lo enxergar
Mas tenta observar o vácuo
Verá que é cego
Que se engana em muito
Sua máscara é de pele
Sua visão , nunca concêntrica
Sua vida é em muito egocêntrica
Tudo que tem é quebradiço
Seu corpo é quebradiço

Você se sente imortal
Acha que pode controlar a morte
Você acha que é forte
Mas tenta mudar o sentido de um rio
Tenta levantar a água com as mãos
Segura o vento
Desvia a sua direção
Impotência, subjugação

Você se desfaz
Na tentativa de virar fumaça
Mas a fumaça passa
Tenta ir à lua
A lua nunca é de graça
Quer desvendar o mistério da vida
Decifra primeiro a sua mente
Ou pelo menos tenta
Vai até o fundo do mistério
Se sentirá impotente

Acha que nada o atinge
Se sente frio, gelado
Mas chega perto da chama de um vulcão
e será queimado

Abre os braços diante da vida
Fecha os olhos
Não pergunta nada
Senta na areia, no lixo, na mata
Não importa
Eleva a sua alma
Segura seus tormentos
Isso sim você controla
Regula sua cobrança
Segue perdido convicto
Nessa eterna buscança
Que cansa
E sofre
Sofre porque tudo faz parte do desafio
O desafio de ser grande
Ou pequeno, tanto faz
Esse é o desafio:
descansar de só querer mais

Não segura o vento
Deixa ele passar em paz.
 



 

Moleca Executiva

Aqui, neste cubículo exprimido de cidade,
Vejo minha criatividade
Reduzida a gotículas de poeira.
Essa enganosa luminosidade,
O encosto torto da cadeira.
Minha vida imprensada em grades,
Meu espetáculo estragando na geladeira.
As horas se arrastando inertes e amorais.
E de notícia do mundo,
Só a escravidão dos jornais.
Um fiasco de sentido passando pelo corpo.
O ar preso, quase um sufoco.
E o cherio de papel frio, congelado.
O arrastar de cada momento suado
O isolado mundo ativo de cada um.
Uma rígida expressão contida,
Sedenta por um pouco de vulgaridade.
É o anseio diário por alguma novidade.
Moleca executiva, perdida,
Num escritório do centro da cidade.
 



 

A Gota

O fim de um temporal
ou o fruto do orvalho.
Prenúncio de um dia quente
rolando num rosto suado.
O cheiro da comida gostosa
escorrendo da boca aflita.
Início de um drama doméstico
brotando insuspeita no telhado
A Gota, o fim, o que faltava.
O transbordar de uma emoção contida
no olhar doente e cansado
Ou a tremida no canto d´olho
da noiva feliz com o noivado.
O presente maldito do pombo
num dia amaldiçoado
A gota, o fim, o que faltava
O limite de um homem cansado
Uma bolha de proteção contra o medo
na ilusão da criança abandonada
A explosão do orgasmo feminino.
O fim do alívio da bexiga.
O líquido derramando do copo.
O cabelo molhado da moça.
A gota, o fim, o que faltava.
O varal, a torneira, a louça.
O limite, a gota d´água.
 


 


Quem é, quem sou

Escondo-me nas areias desertas
Meu refúgio sereno da solidão
Foi do medo do dragão do castelo
que me perdi no mar morto a confusão

Chamas
Tramas
Susto
Fuga

Corro de susto, de medo do bicho
Um monstro verde, enorme e comilão
Pra onde fugir, aonde me esconder?
Aonde fica o coração do dragão?

Prédios que se desmoronam
Guerras que enterram um milhão
Carros, bandidos, fantasmas
Nada é pior que o dragão

Morram três mil de esquerda
Caiam duzentos à minha direita
Fico tranqüila e nem vejo
Mas se me ponho a pensar no dragão
Xiiiiii já quase desmaio de medo

                       Estranho
                       Me zango
                       Não entendo
                       Me rendo!

Foi do medo desse dragão
Que tanto chorei, nunca o entendi
Não te encontro, ó dragão chefe do mundo
Que se decide realiza, só por existir!

Ai, dragão tão escuro!
Que tanto susto me deu
Ah, se desde o início eu já soubesse
Que esse enorme dragão... sou só eu.
 


 


Doce Crime

Muito prazer, estou feliz
Já não tenho mais medidas
A alma emenda na mão
Seu rosto é a receita da vida
Vida sua e minha, sangue e pão
De mãos dadas, pela contra-mão
Dos pés as pegadas deixadas no chão
Que é feito de nuvens
Nuvens da suave brisa-construção

Não sei mais os limites
Que separam o meu do seu
E a minha falta de sorte adoeceu!
Riso que a constância deleita
Esperança quando se chora
Aconchego quando se deita
Amor... onde se escondia o canto
Que agora melodia o dia?
Onde se escondia a ânsia
Que agora descansa a teimosia?

Amor... eis agora o que sou
Toda amor, flor que se expõe ao sol
Peixe sem medo do anzol
Galinha que não corre do farol
Amor... eis o que você me apresentou
" '–Prazer, eu sou o amor
- Prazer, muito prazer, meu Senhor'
E agora?! Polícia! Não me acuda, por favor!
Desse crime a impunidade
É o gozo da felicidade
Fui roubada, seu Polícia,
Sim, sim, ele me roubou
Nunca me devolva, meu amor
Nunca me devolva..."
 


 


Receoso Andante

Tudo parece igual
Tudo que fora, do lado de fora
Tudo normal
Nada que sendo, do lado de dentro
Parece natural
O mundo dá voltas
Grande Terra dá água
E eu aqui no nada
Na hora sem flagra
Meu mundo é o jornal
Tiro de letra, tiro da letra
Meu sentimento banal
Jogo no papel a angústia da alma
A destreza do céu
E o mundo parado, na beira do espasmo
Pedaço amargo do mel
Às vezes essa leseira
Dá cansaço, dá moleira
Mas aí olho para casa
Tudo pronto, em seu lugar
Me sinto pairando, com asas
Mesmo sem voar
Esse momento estagnado
Perdura pela eternidade
Porque é nessa fotografia
Que reside minha felicidade
Nesse êxtase paralisado
Meu amor, não quero que mude
Por favor, para sempre estatua
Por favor, para sempre estar tua
Tenho medo da mudança
Perplexo, imutável que se difunde
Assim que quero, por isso que luto
Não há degrau que para cima ande
Por isso não mudo
 





Moderna Idade

Viva a modernidade!
Viva a moderna, a falta de idade!
Viva a baderna e a mediocridade!
Passa ônibus, passa trem, pára-raio
Corre homem, pula mulher, pára-brisa
Cadê o sol? Roubaram o céu
Cata olho, procura mulher, cata-vento
De onde saiu tanto movimento?
Venho d dentro desse corredor ártico
Que andam chamando de mundo
Mundo deserto, árido, ácido
Beira a loucura, beira a histeria, Beira o Mar
E a quem se atribui poder julgar?
Modernidade... não há julgamento!
Todo mundo reto, enfileirado no tormento
Pecam tudo, pica juízo, pica a mula
Pecador tem verdade que é só sua
E deve pecar.. porque a verdade é técnica
É lapidada, demarcada, lápide verdade
Que se esconde na ciência do número
Para onde vai se esconder o futuro?
Se ninguém parece que fica ou passa
Nosso destino virou uma grande farsa
A justiça fica só na Barsa, na desgraça
Tampa a mente, tampa a boca, trampolim
Na roa gigante , a gangorra não tem vez!
Continuemos vivendo no talvez
E viva a modernidade! Não tema, não canse, não corra!
Unidos no canto do viva
Viva a modernidade...
Modernidade, morra!
 


 


Momentos Difíceis

Pensamentos perturbadores
Viram momentos duradouros
Parecem profecias inatacáveis
De que o que está sempre será
Momentos
Mudam sem prévio aviso
Leves rasteiras no estável
Maldições perpetuadas no juízo
Tormentos
Como tudo na vida, passageiros
Mas se fazem indesejados hóspedes
Que viram donos da casa
Roubam a cama, a mesa
Desfazem o alegre que sempre ria
Tremendo
De medo do nunca passar
Mas como disse
Momentos
Eternos na alma
Indefesos contra o tempo
Insistentes e dominantes
Curvam-se aos dias
Momentos que estão
Não são, não vão
Momentos de histeria
Também não são em vão
Transformam-se em sabedoria
Pequenos pedaços eternos
Não te aflijas
São momentos
Não são de eterna estadia
 


 


Turva realidade

Turva realidade, turva, curta, muda
E porque se faz tão turva
Tão escura, não vejo nada
Só passa por mim alma penada
Do que fui e já não sou mais

Cruel desilusão, torta, porca, forca
Que de mim faz hoje louca
A pisar em cacos de vidro
Se esquivando por entre portas
Que se fecham para a eternidade

Hoje morri e nasci mil vezes
Ao descobrir que não mais existo
E por que então persisto
Se só o que vejo são sombras da morte?
A minha morte tão cheia de vida

Vida minha, vida querida!
Por que me faz chorar sentida
E logo depois me impõe sorriso?
Já começo a perder todo ciso
Nessa teimosia que não adianta

E anda, comanda, ando eu
Já não sei mais se meu ou seu
É meu coração quem me manda
Pular navios, nadar em montanhas
Procurando suas nuvens brancas

Brandas e tão serenas
Sua lindas curvas que me fazem cega
E cega e nega e não tolera
Que façam minhas essas suas luzes
Que me deixam turva
E prossigo escura
Entre os clarões da eterna dúvida

Dúvida essa que segue plena
Entre sussurros uivantes
E gritos abafados
De quem não mais chora e sofre
Mas sofre serena.

 




Negação

Não quero mais falar de amor
Não quero rimas, métrica, rancor
Não quero leitor, choro, reconhecimentos
Não quero tormento e nem lápis de cor

Não quero mais pintar sorrisos
Não quero cobranças, sonhos inúteis
Não quero mais ouvir pessoas fúteis
Não quero nem entender o que se passou

Não quero esperar que nada aconteça
Não ´tô mais afim de condessa
Dizendo que é dona da verdade
Não quero mais falsa amizade
E nem propaganda na porta
Não vou mais ouvir essa droga
Desse noticiário mentiroso
Com esse apresentador asqueroso...
E nem quero mais que esse poema termine

Não quero também nenhuma regra
Não gosto de gente fingida
Detesto quem não pensa na vida
E também acho que eu já penso demais

Não quero barata, cupim nem bezouro
Não quero seu ouro nem que arranquem meu couro!
Não quero bandida, polícia, guerra
Não quero mais ser donzela, agora sou dona do morro!

Não sei o porquê da revolta
Não tenho motivo para tal
Se tivesse também não diria
Hoje não quero poesia
Só quero falar do que eu não quero

E para não dizerem que sou exigente
Eu aceito essa cervejinha gelada, com maresia
Para mim tudo bem uma sombrinha
E façam silêncio
Que essa rede não fica mais vazia.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Caravagio, Êxtase de São Francisco

Cristine Gerk



 

Cristine Gerk, depoimento pessoal, em 3.2.2007:

 

Desde pequena me sinto um pouco distante do mundo como a maioria o vê. Aprendi cedo que uma folha de papel e uma caneta são prolongamentos da alma e uma forma incomparável de transbordar sentimentos, concretizados pela tinta. Minha paixão pela escrita e pela arte de descrever idéias me levou a estudar jornalismo e hojeCristine Gerk sou repórter.

Escrevo poesias desde criança e sempre tive a intenção de publicar um livro, mas, infelizmente, como boa poeta, às vezes minhas intenções se restringem ao campo dos sonhos. Mas este se tornará real.

Em breve atualizarei esta página com o nome da minha primeira obra. Espero que gostem do que vão ler,  a vergonha que sinto de publicar meus sentimentos às vezes me traz a vontade de esconder o meu trabalho. Mas devo a mim mesma não ceder ao receio. E devo a vocês meus agradecimentos por não me deixarem sozinha na tarefa. Boa leitura!

 

   

 

Fabrício Carpinejar, 2002

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Rodrigo Marques, ago/2003