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Domi Chirongo


Ritual poético

 

Um lenço branco, se calhar a semelhança da pomba da paz. Duas panelas de barro, uma acolhendo xima e a outra aconchegando a feijoada mais deliciosa que o universo já produziu. Numa esquina, capulana com a cor de sangue. Um pilão penetrado pelo pilador. Uma pineira aplaudindo o acto. Conchas enfeitando o cheiro a maresia, recordando génese da inspiração… e descoberta das forças divinas! Paralelamente uma massadeira aparece sem saber o que fazer. Nela está encostada uma catana pronta para sentir o gemer duma galinha selvagem que gagueja quando cacareja diante da menina desflorada. Linda por fora e inquieta por dentro! Interior esse que engravida o corpo e contamina a prole! Oh menina do além mar, menina vacinada com cortes de lâmina. Cortes estes que são introduzidos pó preto igual ao carvão moído. Entretanto a vela acesa ilumina o ambiente que culmina com o banho quente de plantas medicinais. Banho este antecedido por outro de sangue de cabrito quando a mente entra de férias. Ó, meu leitor! Os búzios proporcionam outras danças. As vezes de guerra outras de alegria mas todas suficientemente animadas para alegrar. Diferentemente dos amuletos que só nos remetem aos grandes perigos, e sequencialmente lesões e muletas. Os bafos que não são das febres, o canto dos gatos pretos nos telhados da vizinhança, a bebida alcóolica que consome a consciência, o tabaco que emigra sem passaporte e tantas outras quinquilharias fazem parte do mesmo cenário onde a veneração, evocação aos espíritos purificam a alma, apaziguam o espírito moderado, expulsam os maus espíritos da mente e protegem o corpo. É a festa da libertação! Festa do retorno a boa vida. Festa da prevenção e responsabilidade. Festa da harmonia familiar onde tudo é permitido e nada é apetecido.
 

 

 

Leonardo da Vinci, Embrião

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Alvaro Seiça Neves