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Rosalice de Araújo Scherffius

 

Tapioca e broas de goma, na beira da estrada
 

 

Tapiocas, broas de goma, iguarias nordestinas sem par!

Como é bom viajar de carro e parar pelas lojinhas improvisadas na beira da estrada e sentir o gostinho bem Brasil que essas guloseimas portam em si. Melhor ainda quando se está em companhia das melhores, entre irmão mais velho e sobrinho querido que faz todos os desejos das visitantes!

Dezoito anos é muito tempo para se ficar fora do Brasil! é uma vida... A cada dobra do caminho, a cada muda de cenário, ali estava bem diante de mim, um novo mundo! cidades grandes estão ainda maiores, progresso, turismo poluição e todos os legados da vida deste novo milênio. Mas são nas pequenas coisas do mundo de ontem,do tempo do sempre, assim como havia guardado na memória desde minha infância, são nestas pequenas ocorrências que reencontrei o meu Brasil e fiquei feliz ao sentir que ainda está intacto!

Essa boa gente, tão hospitaleira que consegue sorrir apesar de todos os pesares... que consegue mostrar cortesia ao visitante de passagem, e que está sempre se preocupando em fazer o melhor para
agradar a todos... "freguesa, deixa eu fazer uma tapioca fresquinha, essa aqui já tem mais de hora... " E com um enorme sorriso nos lábios a velhinha mistura a goma com sal e água e acena para a vizinha ir buscar um coco ralado, ingrediente que dará um sabor todo especial a saborosa panqueca indígena que só existe mesmo no nordeste brasileiro.

"A senhora tá falando essa língua, assim com a mocinha ai,né? é inglês,né?" Pergunta curiosa a meninota ao lado da palhoça humilde e limpinha, onde as tapiocas estavam sendo preparadas. "é inglês sim," responde meu irmão e explica "elas moram nos Estados Unidos, estão aqui só passeando". Este incidente ocorreu em uma cidadezinha chamada Barras de... (não lembro bem o nome, perdão leitores). Um pequeno lugarejo que fica entre Teresina e Parnaíba.

Um destes intactos cartões postais brasileiros que com certeza se tornam cada vez mais raros...  A simplicidade e essência da legitima cultura do nordestino, "que é sobretudo um forte", como disse o grande escritor Euclides da Cunha. (ou será que foi Graciliano Ramos?...me perdoem, mas já faz muito tempo mesmo que li aquele texto!!!)

Ao vivenciar uma experiência como esta, meu coração
fica cheio de gratidão e minhas preces sobem a Deus pleiteando o bem estar desta gente...

O grande Chico Buarque bem descreve esse povo nosso em poesia feito canção... "são casas simples com cadeiras na calcada, e na fachada escrito em cima que é um lar... é gente humilde, sem não ter com quem contar..." Essa gente conta consigo mesmo a cada dia que Deus dá. E Deus dará... é lindo ver o espírito empreendedor do nordestino das áreas mais afastadas. Trabalham com paciência de Jó e nunca perdem a esperança... Desde os meninos (quase ainda nenéns) vendendo broas de goma e dindin (aquele geladinho com gosto de frutas), também as mocinhas vendendo artesanato de sua própria fabricação, homens fritando peixes e aves, senhoras idosas ainda fazendo tapioca ou até mesmo renda de bilros, mães esperando as crianças chegarem da escola,para saírem vendendo pirulitos caseiros ou tijolinhos de doce de leite. Um pouco de tudo e de tudo um pouco. Redes, cajus que cresceram dentro de uma garrafa! sandálias de palhinha, vidrinhos de areia colorida. Os queijos
de coalho, de manteiga. Compotas das mais variadas frutas, frutas dos mais variados sabores... é um mundo encantado e especial que em si comporta um universo mais complexo do que se pode imaginar...  Sabores Brasil que talvez logo deixarão de existir... Sabores Brasil que devem ser incentivados a existir para sempre!!!

Espero que eu possa em breve fazer outra viagem assim. Rever e aprender com os valores da terrinha. Espero que os brasileiros honrem com seu patrocínio e respeitem essa economia espontânea e esses empreendimentos de beira de estrada... Espero que neste novo milênio de globalização, ainda exista espaço para as pacatas barraquinhas de tapioca, broas de goma e outras iguarias nordestinas... E mais ainda, espero que aquela boa velhinha continue a sorrir e se preocupar em fazer uma tapioca fresquinha para sua freguesia, por muito e muito tempo.
 

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Michelangelo, Pietá

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J. Romero Antonialli