Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

Eunice Arruda




É tempo de poesia


[in A Gazeta, 18.11.1960]


 
Em versos brancos Eunice Arruda fala pela novíssima geração
 

Texto de IRACEMA WILLIAM

 

Aos 12 anos começa a compor suas primeiras poesias: sonetos. Jamais havia lido um livro de poesias, apenas duas ou três, mas sente uma invencível necessidade de exprimir suas emoções. Toma gosto pela coisa, e ao invés de debruçar-se sobre os compêndios escolares, procura ler mais e mais poesias. Timidamente, mostra seus poemas a Mário Mattoso, poeta de sua cidade natal, que a orientou bastante.

A menina cresceu, veio para São Paulo, continuou a escrever versos, e teve seu livro de estréia lançado há poucos dias. Trata-se de Eunice Arruda, e seu livro “É tempo de noite” da “Coleção dos Novíssimos”, veio colocá-la num lugar de destaque entre os poetas da “novíssima geração”.
 
LIRISMO SUBJETIVO
 

Suas poesias, essencialmente líricas e subjetivas, exprimem estados de alma, inspirados tanto pelo amor, como pela procura da felicidade ou a angústia da solidão. Veja-se por exemplo: “Dúvida”: “Quero que me digas / se o azul de teus olhos / é o azul de teus olhos / ou / o pedaço de céu / que fugiu de minha / alma”.

Ou então: “Angústia”: “buscar- / te / na solidão / das praias / desertas / ouvir-te / na voz / do / vento / e / sentir / doer / na alma / a certeza amarga / de / nunca / ter / encontrar”.

Ou ainda o arrebatamento jovem de “Extremismo”: “incendiarei tudo se / você achar que tudo / está errado. / Quebrarei minha vida e / esconderei os cacos”.

Eunice escreve somente em versos brancos, porque é de opinião que eles dão maior liberdade de expressão, não aprisionam as palavras em métricas rígidas. Sua capacidade de síntese é notável. Nas composições mais curtas consegue transmitir tudo que lhe vai na alma, com absoluta economia de palavras. Como neste: “Tema para abertura de um novo sentimento”: “Agora / a morte / da paz”.

OPINIÕES
 

- Sente que foi influenciada por algum poeta?

- Não, acho que em cada fase de minha vida tive preferência por um determinado autor, primeiramente Augusto Frederico Schmidt, mas tarde Manoel Bandeira, Vinícius de Moraes, Fernando Pessoa e Rainer Maria Rilke. Não me filio a nenhuma corrente poética.

Nas “Cartas a um jovem poeta” de Rainer Maria Rilke, o autor aconselha aos jovens que desejam seguir a carreira literária: “Se a própria existência cotidiana lhe parecer pobre, não a acuse. Acuse a si mesmo, diga consigo que não é bastante poeta para extrair as riquezas”.
Eunice está de pleno acordo com a opinião de Rilke. É preciso tirar do cotidiano o que ele de belo, procurar novos ângulos, ver o que a todos passa despercebido.

Declara ainda a poetisa:

- “O escritor deve se abster de levar uma vida cheia de atividades corriqueiras, para poder se dedicar inteiramente à sua arte. A vivência obscurece o mundo interior, e o poeta precisa estar sempre escutando sua voz interior o que constitui uma forma de fuga, mas permite captar o momento em toda sua intensidade. Isso certamente representa um sacrifício para o artista.

Em “Mutilação”, Eunice defende seu ponto de vista: “A gente se abstém de viver / porque viver estraga / mas ouço o grito de / uma cidade / no pânico de uma boca / calada”.
 
NOVÍSSIMOS
 

- Encontrou alguma dificuldade para publicar sua obra de estréia?

- Conheci o editor Massao Ohno quando ainda planejava lançar a Coleção dos Novíssimos. Interessou-se pelas minhas poesias e quis publicá-las. Toda a primeira edição do livro já está esgotada. Aliás, os volumes editados pela “Coleção” são vendidos sob a forma de assinaturas, de modo que, antes mesmo de serem lançados, já têm quase toda a sua primeira edição adquirida.

- O que sentiu ao ver seu primeiro livro editado?

- Naturalmente, fiquei muito satisfeita, mas sinto uma alegria maior quando consigo exprimir num poema tudo que realmente quero comunicar. A apresentação do livro está excelente, com belíssima capa e ilustrações de João Suzuki.

Finalmente, Eunice conta-nos seus planos para o futuro:

- Atualmente, estou escrevendo contos, mas sinto que me realizo mais na poesia.


 

 

 

 

24/06/2005