Vitorino Nemésio
Requiescat
					Direi, pela noite, não ódio que tivesse
					Nem detestar vida corpórea e ninhos de manha,
					Mas meu alto cansaço, a tristeza de lá
					Onde se sente o aqui traído, a falsa entranha.
					Direi --- não "fora!" ao mundo que me cinge
					(Outro onde o sei e como chegaria?),
					Mas dos anos de ver, pensar durando
					Retiro uma moeda de nada,
					Fruto do meu suor, e pago o pão que se me deve,
					Compro o silêncio que se me deve
					Por ter cumprido a palavra,
					Trabalhado nas palavras,
					E por elas merecido a terra leve.
					                                        15 de junho de 1971
					                                (In: Obras completas. Vol. II.
					                                Poesia. Lisboa, Imprensa Nacio
					                                nal/Casa da Moeda, 1989, p. 634)
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