Virgílio Fernandes Almeida


O poeta, o temor e o computador

Mais um congestionamento. O trânsito segue seu rítmo lento habitual. Buzinas, impaciência e pensamentos. De repente, surge Chico Buarque no rádio, cantando o clássico samba de Paulinho da Viola: Sinal Fechado. "Olá como vai? Tudo bem, eu vou indo correndo pegar um lugar no futuro e você?". Qual o meu lugar no futuro? Eis uma questão que muitos brasileiros indagam. O futuro vem sempre acompanhado de um mistura de esperanças e incertezas. Existem algumas invenções humanas que claramente têm a cara do futuro. Os computadores, os softwares, os robôs e as redes de comunicação com certeza serão ubíquos num futuro não muito distante. É sempre bom lembrar que o próximo milênio chega daqui a cinco anos! No plano das incertezas quanto ao futuro cibernético, muitos se perguntam: será que o computador vai ocupar o meu lugar?

Em um de seus ensaios sobre literatura e tecnologia, o mexicano Octavio Paz, prêmio Nobel de literatura, questiona se o computador tomaria o lugar do poeta. "Nada impede que o poeta se sirva de um computador para escolher e combinar as palavras que hão de compor seus poemas". Entretanto, o computador não suprime o poeta, como não o suprimem os dicionários e os tratados sobre como fazer poesia. Um poema não é fruto apenas de um amplo vocabulário e de um conjunto de regras para escolher e combinar as palavras do vocabulário. O poema é fruto principalmente da atitude criadora da alma humana. Isto se estende aos vários campos da criatividade do homem: a literatura, a pintura, a música, o cinema e outros. Não há computador que substitua a arte e o talento de um Drummond, um Guimarães Rosa, um Chico Buarque, um Portinari uma Fernanda Montenegro ou uma Adélia Prado.

As histórias do homem e suas máquinas têm sido construídas juntas. Algumas máquinas tem o papel de ajudar o homem na transformação de seu ambiente. Auxiliam na construção de estradas, barragens, portos, etc. Outras máquinas, como carros e aviões buscam ajudar o homem a vencer limitações de distância e tempo. Existem máquinas cujo objetivo é ampliar as habilidades dos seres humanos. Por exemplo, o microscópio e o telescópio ampliam a visão das pessoas e o telefone amplia a capacidade de comunicação. Com sua capacidade de processar velozmente grandes massas de informação e controlar complexas operações, os computadores se incluem nesta última categoria. O computador e seus softwares não devem ser vistos como ameaças ao homem e sim como uma possibilidade de ampliar e acentuar suas habilidades. A automação não deve ser vista simplisticamente como forma de substituir pessoas e sim como um recurso para aumentar a qualificação e a capacidade da força de trabalho.

Muitas pessoas veêm com temor o acelerado progresso da tecnologia dos computadores e sua silenciosa e constante penetração em quase todos espaços da vida contemporânea. Nos bancos, no comércio, nos hospitais, nos tribunais, nos governos, nas indústrias e no lazer há sempre um computador presente. Há sempre o temor do computador tomar o lugar das pessoas e reduzir os empregos. A experiência externa tem mostrado que os diversos tipos de trabalhos de uma sociedade são afetados diferentemente pela ampliação dos domínios do computador. Trabalhos de natureza mais repetitiva em fábricas e escritórios têm sido mais atingidos pelo avanço da informática. É imprescindível que sindicatos, associações de classes, empresários e governo criem uma agenda de discussão sobre a evolução da informática numa sociedade complexa, dividida e injusta como a brasileira. Discutir e negociar o grau e a velocidade da informatização da sociedade, a reciclagem do trabalhador brasileiro e a alfabetização em informática são tarefas chaves no desenho do futuro de nosso país .


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