Renato Russo

Eduardo e Mônica

Quem um dia irá dizer Que existe razão Nas coisas feitas pelo coração ? E quem irá dizer Que não existe razão ? Eduardo abriu os olhos mas não quis se levantar: Ficou deitado e viu que horas eram Enquanto Mônica tomava um conhaque, Noutro canto da cidade, Como eles disseram. Eduardo e Mônica um dia se encontraram sem querer E conversaram muito mesmo prá tentar se conhecer. Foi um carinha do cursinho do Eduardo que disse: - Tem uma festa legal, e a gente quer se divertir. Festa estranha, com gente esquisita: - Eu não estou legal. Não aguento mais birita. E a Mônica riu e quis saber um pouco mais Sobre o boyzinho que tentava impressionar E o Eduardo, meio tonto, só pensava em ir prá casa: - É quase duas, eu vou me ferrar Eduardo e Mônica trocaram telefone Depois telefonaram e decidiram se encontrar O Eduardo sugeriu uma lanchonete Mas a Mônica queria ver o filme do Godard. Se encontraram então no parque da cidade A Mônica de moto e o Eduardo de camelo. O Eduardo achou estranho e melhor não comentar Mas a menina tinha tinta no cabelo. Eduardo e Mônica eram nada parecidos - Ela era de Leão e ele tinha dezesseis. Ela fazia medicina e falava alemão E ele ainda nas aulinhas de inglês. Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus, De Van Gogh e dos Mutantes, De Caetano e de Rimbaud E o Eduardo gostava de novela E jogava futebol-de-botão com seu avô. Ela falava coisas sobre o Planalto Central, Também magia e meditação. E o Eduardo ainda estava No esquema "escola-cinema-clube-televisão". E, mesmo com tudo diferente, Veio mesmo, de repente, Uma vontade de se ver E os dois se encontravam todo dia E a vontade crescia, Como tinha de ser. Eduardo e Mônica fizeram natação, fotografia, Teatro e artesanato, e foram viajar. A Mônica explicava pro Eduardo Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar: Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer E decidiu trabalhar; E ela se formou no mesmo mês Em que ele passou no vestibular. E os dois comemoraram juntos E também brigaram juntos, muitas vezes depois. E todo mundo diz que ele completa ela e vice-versa, Que nem feijão com arroz. Construíram uma casa uns dois anos atrás, Mais ou menos quando os gêmeos vieram - Batalharam grana e seguraram legal A barra mais pesada que tiveram. Eduardo e Mônica voltaram prá Brasília E a nossa amizade dá saudade no verão. Só que nessas férias não vão viajar Porque o filhinho do Eduardo Tá de recuperação E quem um dia irá dizer Que existe razão Nas coisas feitas pelo coração ? E quem irá dizer Que não existe razão ?


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