Raimundo Correia

Ondas...

Ilha de atrozes degredos! Cinge um muro de rochedos Seus flancos. Grosso a espumar Contra a dura penedia, Bate, arrebenta, assobia, Retumba, estrondeia o mar. Em circuito, o Horror impera; No centro, abrindo a cratera Flagrante, arroja um volcão Ígnea blasfêmia às alturas... E, nas ínvias espessuras, Brame o tigre, urra o leão. Aqui chora, aqui, proscrita, Clama e desespera aflita A alma de si mesma algoz, Buscando na imensa plaga, Entre mil vagas, a vaga, Que neste exílio a depôs. Se a vida a prende à matéria, Fora desta, a alma, sidérea, Radia em pleno candor; O corpo, escravo dos vícios, É que teme os precipícios, Que este mar cava em redor. No azul eterno ela busca, No azul, cujo brilho a ofusca, Pairar, incendida ao sol, Despindo a crusta vil, onde Se esconde, como se esconde A lesma em seu caracol. Contempla o infinito ... Um bando De gerifaltos voando Passou, desapareceu No éter azul, na água verde... E onde esse bando se perde, seu longo olhar se perde... Contempla o mar, silenciosa: Ora mansa, ora raivosa, Vai e vem a onda minaz, E entre as pontas do arrecife, Às vezes leva um esquife, Às vezes um berço traz. Contempla, de olhos magoados, Tudo... Muitos degredados Findo o seu degredo têm; Vão-se na onda intumescida Da Morte, mas na da Vida, Novos degredados vêm. Ó alma contemplativa ! Vem já, decumana e altiva, Entre as ondas talvez, A que, no supremo esforço Da morte, em seu frio dorso, Te leve ao largo, outra vez. Quanto esplendor! São aquelas As regiões de luz, que anelas, Rompe os rígidos grilhões, Com que à Carne de agrilhoa O instinto vital! E voa, e voa àquelas regiões!...


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