A Martha Willis
       
      Nertan Macedo 
    I

    E antes que o mar calasse,
    perguntei-lhe: - “Por que choras?”
    A ânsia da resposta, reclinada,
    Seus cabelos colheram minhas mãos.

    Ficamos assim, quietos, num instante,
    De relutância e perdão. O mar parado.
    A praia ao longo do olhar aflito,
    As mãos roladas no seus ombros nus.

    De fato, a tristeza e o silêncio. Outra vez,
    repeti-lhe: - “Por que choras?”
    Seus lábios se abriram num suspiro,

    Sufocada, entre a angústia e a certeza.
    Leve, como as asas desse vento,
    Recolheu e aceitou o sonho ausente.
     

    II

    Escuto: bate teu coração inundado.
    O mar inunda-o de doçura. (Fronte,
    repousa afinal nas asas desse vento
    e deixa que elas te conduzam...)

    Tudo quanto sou - sangue na areia.
    Exangue, mutilado, face opressa.
    Erguido do anjo no clamor do mar.
    Alma ferida por estranha estrela.

    Embora mires o mar, o mar te mira
    E te mirando, aceita como irmão
    O céu. Ungidos por teu corpo solitário.

    E a lua, a lenta lua fria, a lua
    Remota andante pelas madrugadas
    Deita raios de amor em teus cabelos.
     

    III

    E tudo passa. Os cães compridos desfilaram,
    Uivando nessas praias, nessas mortas dunas.
    Elas também se foram, a mão dos ventos,
    Quando passa, esquece o próprio tempo.

    Ervas daninhas, meigas flores, bustos,
    Seios, cabelos, derrocados ventres.
    Murchas faces, estátuas mutiladas,
    Na indecifrável processão dos ventos.

    E tudo passa. Até teu olhas de esperança,
    Teus sentidos dispersos como búzios rolados,
    Nas asas do mistério, ondulados, arfantes.

    E nem da infância mais terei memória
    Do que se foi... Porque na sexta hora
    Todos os gestos se terão partido.

       
 Remetente: Isolda Pedrosa

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