Acalanto de Adalgisa  
       
      Nertan Macedo 
       
       Adormecei, amiga, adormecei,
      Urge adormecer, adormecei.
      Colocai vossas mãos, assim de leve,
      assim de manso, colocai
      Vossas mãos sobre as minhas,
      Adormecei vosso corpo, adormecei

      Dai-me a quietude e o silêncio,
      A tranqüilidade e a placidez serena,
      A luz do vosso rosto adormecido,
      A vossa sombra, amiga, adormecei.

      Há de vir a angústia, há de vir
      O cansaço e o sono, velarei
      Vosso corpo inundado de sopros
      Criadores de mundos distantes.

      Buscai no sono o esquecimento da vida,
      Cotidiana e triste, adormecei amiga.
      Guiai vosso sonho para o mundo das noites,
      Onde asas de anjos, branquinhas, levitam,
      Docemente, sobre a luz e a neve.
      (Ai, onde deixei minha inocência antiga?)

      Dormem vales e montanhas da terra.
      Na haste, dorme a flor pendida e fresca,
      Banhada de perfume e de luar.
      Dormem a lua no céu, a cidade e o mar,
      A poesia no mundo, a música no ar.

      Adormecei, amiga, adormecei,
      Esta noite é de sono calmo e bom.
      Um dia há de descer nos descampados
      Do mundo a noite erma e fria.
      Ela trará no seu ventre a agonia das virgens
      E a manhã nascerá sobre o último sono,
      O derradeiro sono, imperturbável sono.

      Adormecei, amiga, adormecei,
      Esta noite é de sono calmo e bom.

         
       
 Remetente: Isolda Pedrosa

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