Clique aqui: milhares de poetas e críticos da lusofonia!

Endereço postal, expediente 

e equipe

 

Escreva para o editor

Escreva-nos

 

Página do editor Soares Feitosa

 

Mia Couto

info@ME.co.mz

Uma notícia do poeta:

 

Poesia:

 

Crítica, ensaio e comentário:

 

Fortuna crítica

 

Página inicial do Jornal de Poesia

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Clique aqui: milhares de poetas e críticos da lusofonia!

Endereço postal, expediente 

e equipe

 

Escreva para o editor

Escreva-nos

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

Só a DIDÁTICA em prol do Homem legitima o conhecimento

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Página do editor Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

Mia Couto


 

Carta ao Presidente Bush de Mia Couto
(27-3-2003)

A legitimidade da guerra no Iraque numa carta de Mia Couto dirigida ao Presidente George W. Bush.


Senhor Presidente:

Sou um escritor de uma nação pobre, um país que já Mia Couto, Moçambiqueesteve na vossa lista negra. Milhões de moçambicanos desconheciam que mal vos tínhamos feito. Éramos pequenos e pobres: que ameaça poderíamos constituir ? A nossa arma de destruição massiva estava, afinal, virada contra nós: era a fome e a miséria...

Alguns de nós estranharam o critério que levava a que o nosso nome fosse manchado enquanto outras nações beneficiavam da vossa simpatia. Por exemplo, o nosso vizinho - a África do Sul do "apartheid" - violava de forma flagrante os direitos humanos.

Durante décadas fomos vítimas da agressão desse regime. Mas o regime do "apartheid" mereceu da vossa parte uma atitude mais branda: o chamado "envolvimento positivo". O ANC esteve também na lista negra como uma "organização terrorista!". Estranho critério que levaria a que, anos mais tarde, os taliban e o próprio Bin Laden fossem chamadas de "freedom fighters" por estrategas norte-americanos.

Pois eu, pobre escritor de um pobre país, tive um sonho. Como Martin Luther King certa vez sonhou que a América era uma nação de todos os americanos. Pois sonhei que eu era não um homem mas um país. Sim, um país que não conseguia dormir. Porque vivia sobressaltado por terríveis factos. E esse temor fez com que proclamasse uma exigência. Uma exigência que tinha a ver consigo, Caro Presidente. E eu exigia que os Estados Unidos da América procedessem à eliminação do seu armamento de destruição massiva.

Por razão desses terríveis perigos eu exigia mais: que inspectores das Nações Unidas fossem enviados para o vosso país. Que terríveis perigos me alertavam? Que receios o vosso país me inspiravam? Não eram produtos de sonho, infelizmente. Eram factos que alimentavam a minha desconfiança. A lista é tão grande que escolherei apenas alguns:

- Os Estados Unidos foram a única nação do mundo que lançou bombas atómicas sobre outras nações;

- O seu país foi a única nação a ser condenada por "uso ilegítimo da força" pelo Tribunal Internacional de Justiça;

- Forças americanas treinaram e armaram fundamentalistas islâmicos mais extremistas (incluindo o terrorista Bin Laden) a pretexto de derrubarem os invasores russos no Afeganistão;

- O regime de Saddam Hussein foi apoiado pelos EUA enquanto praticava as piores atrocidades contra os iraquianos (incluindo o gaseamento dos curdos em 1998);

- Como tantos outros dirigentes legítimos, o africano Patrice Lumumba foi assassinado com ajuda da CIA. Depois de preso e torturado e baleado na cabeça o seu corpo foi dissolvido em ácido clorídrico;

- Como tantos outros fantoches, Mobutu Seseseko foi por vossos agentes conduzido ao poder e concedeu facilidades especiais à espionagem americana: o quartel-general da CIA no Zaire tornou-se o maior em África. A ditadura brutal deste zairense não mereceu nenhum reparo dos EUA até que ele deixou de ser conveniente, em 1992;

- A invasão de Timor Leste pelos militares indonésios mereceu o apoio dos EUA. Quando as atrocidades foram conhecidas, a resposta da Administração Clinton foi "o assunto é da responsabilidade do governo indonésio e não queremos retirar-lhe essa responsabilidade";

- O vosso país albergou criminosos como Emmanuel Constant um dos líderes mais sanguinários do Taiti cujas forças para-militares massacraram milhares de inocentes. Constant foi julgado à revelia e as novas autoridades solicitaram a sua extradição. O governo americano recusou o pedido;

- Em Agosto de 1998, a força aérea dos EUA bombardeou no Sudão uma fábrica de medicamentos, designada Al-Shifa. Um engano? Não, tratava-se de uma retaliação dos atentados bombistas de Nairobi e Dar-es-Saalam;

- Em Dezembro de 1987, os Estados Unidos foi o único país (junto com Israel) a votar contra uma moção de condenação ao terrorismo internacional. Mesmo assim, a moção foi aprovada pelo voto de cento e cinquenta e três países;

- Em 1953, a CIA ajudou a preparar o golpe de Estado contra o Irão na sequência do qual milhares de comunistas do Tudeh foram massacrados. A lista de golpes preparados pela CIA é bem longa.

- Desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA bombardearam: a China (1945-46), a Coreia e a China (1950-53), a Guatemala (1954), a Indonésia (1958), Cuba (1959-1961), a Guatemala (1960), o Congo (1964), o Peru (1965), o Laos (1961-1973), o Vietename (1961-1973), o Camboja (1969-1970), a Guatemala (1967-1973), Granada (1983), Líbano (1983-1984), a Líbia (1986), Salvador (1980), a Nicarágua (1980), o Irão(1987), o Panamá (1989), o Iraque (1990-2001), o Kuwait (1991), a Somália (1993), a Bósnia (1994-95), o Sudão (1998), o Afeganistão (1998), a Jugoslávia (1999).

- Acções de terrorismo biológico e químico foram postas em prática pelos EUA: o agente laranja e os desfolhantes no Vietname, o vírus da peste contra Cuba que durante anos devastou a produção suína naquele país.

- O Wall Street Journal publicou um relatório que anunciava que 500 000 crianças vietnamitas nasceram deformadas em consequência da guerra química das forças norte-americanas.

Acordei do pesadelo do sono para o pesadelo da realidade. A guerra que o Senhor Presidente teimou em iniciar poderá libertar-nos de um ditador. Mas ficaremos todos mais pobres. Enfrentaremos maiores dificuldades nas nossas já precárias economias e teremos menos esperança num futuro governado pela razão e pela moral. Teremos menos fé na força reguladora das Nações Unidas e das convenções do direito internacional. Estaremos, enfim, mais sós e mais desamparados.

Senhor Presidente:

O Iraque não é Saddam. São 22 milhões de mães e filhos, e de homens que trabalham e sonham como fazem os comuns norte-americanos. Preocupamo-nos com os males do regime de Saddam Hussein que são reais. Mas esquece-se os horrores da primeira guerra do Golfo em que perderam a vida mais de 150 000 homens...

O que está destruindo massivamente os iraquianos não são as armas de Saddam. São as sanções que conduziram a uma situação humanitária tão grave que dois coordenadores para ajuda das Nações Unidas (Dennis Halliday e Hans Von Sponeck) pediram a demissão em protesto contra essas mesmas sanções. Explicando a razão da sua renúncia, Halliday escreveu: "Estamos destruindo toda uma sociedade. É tão simples e terrível como isso. E isso é ilegal e imoral". Esse sistema de sanções já levou à morte meio milhão de crianças iraquianas.

Mas a guerra contra o Iraque não está para começar. Já começou há muito tempo. Nas zonas de restrição aérea a Norte e Sul do Iraque acontecem continuamente bombardeamentos desde há 12 anos Acredita-se que 500 iraquianos foram mortos desde 1999. O bombardeamento incluiu o uso massivo de urânio empobrecido (300 toneladas, ou seja 30 vezes mais do que o usado no Kosovo).

Livrar-nos-emos de Saddam. Mas continuaremos prisioneiros da lógica da guerra e da arrogância. Não quero que os meus filhos (nem os seus) vivam dominados pelo fantasma do medo. E que pensem que, para viverem tranquilos, precisam de construir uma fortaleza. E que só estarão seguros quando se tiver que gastar fortunas em armas.

Como o seu país que despende 270 000 000 000 000 dólares (duzentos e setenta biliões de dólares) por ano para manter o arsenal de guerra. O senhor bem sabe o que essa soma poderia ajudar a mudar o destino miserável de milhões de seres. O bispo americano Monsenhor Robert Bowan escreveu- lhe no final do ano passado uma carta intitulada "Porque é que o mundo odeia os EUA?"

O bispo da Igreja Católica da Florida é um ex--combatente na guerra do Vietname. Ele sabe o que é a guerra e escreveu: "O senhor reclama que os EUA são alvo do terrorismo porque defendemos a democracia, a liberdade e os direitos humanos. Que absurdo, Sr. Presidente ! Somos alvos dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana...

Somos alvos dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso governo fez coisas odiosas. Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes popularmente eleitos substituindo-os por ditadores militares, fantoches desejosos de vender o seu próprio povo às corporações norte-americanas multinacionais ? E o bispo conclui: O povo do Canadá desfruta de democracia, de liberdade e de direitos humanos, assim como o povo da Noruega e da Suécia.

Alguma vez o senhor ouviu falar de ataques a embaixadas canadianas, norueguesas ou suecas? Nós somos odiados não porque praticamos a democracia, a liberdade ou os direitos humanos. Somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos dos países do Terceiro Mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas multinacionais."

Senhor Presidente:

Sua Excelência parece não necessitar que uma instituição internacional legitime o seu direito de intervenção militar. Ao menos que possamos nós encontrar moral e verdade na sua argumentação. Eu e mais milhões de cidadãos não ficamos convencidos quando o vimos justificar a guerra. Nós preferíamos vê-lo assinar a Convenção de Quioto para conter o efeito de estufa. Preferíamos tê-lo visto em Durban na Conferência Internacional contra o Racismo. Não se preocupe, senhor Presidente.

A nós, nações pequenas deste mundo, não nos passa pela cabeça exigir a vossa demissão por causa desse apoio que as vossas sucessivas administrações concederam apoio a não menos sucessivos ditadores. A maior ameaça que pesa sobre a América não são armamentos de outros. É o universo de mentira que se criou em redor dos vossos cidadãos.

O perigo não é o regime de Saddam, nem nenhum outro regime. Mas o sentimento de superioridade que parece animar o seu governo. O seu inimigo principal não está fora. Está dentro dos EUA. Essa guerra só pode ser vencida pelos próprios americanos. Eu gostaria de poder festejar o derrube de Saddam Hussein. E festejar com todos os americanos. Mas sem hipocrisia, sem argumentação e consumo de diminuídos mentais. Porque nós, caro Presidente Bush, nós, os povos dos países pequenos, temos uma arma de construção massiva: a capacidade de pensar.


Notas do editor: 

1. Respeitada a ortografia de Moçambique

2. Fonte: Moçambique Editora 

A seguir, 

a resposta de um brasileiro:

 

ARISTEU BATISTA FARIAS

thezeu@terra.com.br  

 

 
Prezado escritor Mia Couto:

 

Em 25 de junho de 1.975, finalmente Moçambique se livrou do jugo colonialista português. Samora Machel e a sua Frente de Libertação de Moçambique, a FRELIMO, assumiram, como sempre desejaram, a responsabilidade pelo futuro do povo moçambicano. Neste mesmo ano, Moçambique foi aceito com membro da ONU.Mas em 1.977 a sua FRELIMO se transforma no Partido Operário e Camponês de Moçambique. Instaura o regime do partido único. Faz o Estado títere do Partido. Assina o Tratado de Amizade com a URSS. Coletiviza. Exclui os seus compatriotas que ousam pensar diferente. E oferece as causas concretas para a Guerra Civil, tendo por adversário grande parte de seu próprio povo, tangida para os braços da Resistência Nacional Moçambicana, a RENAMO.

Quinze anos depois, em 1.992,  a URSS já não existe e Moçambique consegue costurar um precário acordo de paz com seus próprios concidadãos.

Depois de 1 milhão de mortos, depois de 1,7 milhão de refugiadosVocê foi parte ativa deste horror, que, infelizmente, está longe de terminar.

 

VOCÊ TAMBÉM É RESPONSÁVEL  PELA TRAGÉDIA QUE MOÇAMBIQUE VIVE HOJE.

 

Durante os quinze anos da Guerra Civil foram plantadas 2 milhões de minas terrestres no território de seu próprio país. Quando a sua Guerra Civil terminou, a área rural de 123 dos 128 municípios  moçambicanos estava comprometida por minas terrestres. Apenas 1% deste total foi removido. Custa 300 dólares eliminar cada uma dos 2 milhões de minas terrestres que vocês plantaram em seu próprio país, na "continuação da política por outros meios". Terminada a guerra, o seu "pobre país" deve a si mesmo, portanto, a razoável quantia de 600 milhões de dólares. Só para desativar minas terrestres.

Antes de continuar, gostaria que você desse uma olhada na fotografia. Em primeiro plano, aparece a Princesa Diana. É o ato de lançamento da campanha mundial pela abolição de minas terrestres. Propositalmente, esta foto não é a foto oficial, e foi tirada por uma câmara comum. Mesmo assim, você pode perceber quem está em segundo plano.

 

A princesa & o plebeu (brasileiro pra inglês VQHonra ao mérito)ABF

É um oficial dos Fuzileiros Navais brasileiros, assim como eu também sou. Foi escolhido para o lançamento da campanha contra minas terrestres porque tinha acabado de ter parte de uma perna amputada, em um acidente quando ensinava a desativar minas terrestres, como membro de uma Força de Paz da ONU.

Desativar minas terrestres significa estar deitado no chão, manuseando algo a não mais do que dois palmos do rosto. Um erro, e este "algo" pode explodir, principalmente quando, como em Moçambique, vocês não se satisfizeram em plantar apenas 2 milhões de minas terrestres. Vocês também aperfeiçoaram o processo, de modo que a mina mais aparente, se removida sem uma determinada perícia, pode detonar a escondida. Exatamente para vitimar quem ousar desminar. Na guerra, e na paz também.

As minas terrestres foram plantadas em Moçambique por vocês em meio a plantações e a pastos, que não são objetivos militares. O objetivo da minagem em guerras internas é este mesmo: levar inclusive mulheres, idosos e crianças "inimigas" à inanição, à prostração, à morte pela fome. Para dobrar vontades. Para dominar corações e mentes. Para fazer o terror presente em cada instante da vida do povo mais indefeso, o povo da roça, aquele que tem que ser convencido a fornecer a mão de obra da guerra do povo.

Não há tanta diferença moral entre plantar uma mina terrestre no quintal de alguém e lançar a Fat Boy em Hiroshima. Ou uma anônima JDAM em Bagdá. Mas há uma terrível diferença concreta: a mina terrestre custa módicos 30 dólares a unidade nas mãos de qualquer razoável mercador da morte. Que vive muito bem porque existem pobres como vocês.

 Seria muito bom se um dia pudermos contar com você, como um ser humano por inteiro. Superando a sua insistência em ser formiga. Testemunhando, com a nossa compreensão e apoio, a insanidade da guerra do povo. Das cerca de trinta guerras que hoje existem pelo mundo, apenas duas ocupam a manchete dos jornais. As demais não preocupam, porque são, apenas, guerras do povo.

 

SIMPLESMENTE, VOCÊ PODERÁ ESTAR NOS AJUDANDO A CONSTRUIR A PAZ.

Página inicial do Jornal de Poesia

Um nobel da Sadã