Ruy Espinheira Filho


Poema

A que morreu às portas de Madrid, Com uma praga na boca E a espingarda na mão, Teve a sorte que quis, Teve o fim que escolheu. Nunca, passiva e aterrada, ela rezou. E antes de flor, foi, como tantas, pomo. Ninguém a virgindade lhe roubou Depois dum saque — antes a deu A quem lha desejou, Na lama dum reduto, Sem náusea mas sem cio, Sob a manta comum, A pretexto do frio. Não quis na retaguarda aligeirar, Entre champanhe, aos generais senis, As horas de lazer. Não quis, ativa e boa, tricotar Agasalhos pueris, No sossego dum lar. Não sonhou minorar, Num heroísmo branco, De bicho de hospital, A aflição dos aflitos. Uma noite, às portas de Madrid, Com uma praga na boca E a espingarda na mão, À hora tal, atacou e morreu. Teve a sorte que quis. Teve o fim que escolheu.


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