Vim agora da noite e trouxe tudo:
 ela me deu a mão e me ensinou
 e eu trago na algibeira as senhas todas.
Agora não há sonhos impossíveis:
 não há fruto proibido que eu não coma
 nem vagabundo longe que eu não seja
 nem cavalo selvagem que não monte
 nem navio no mar que não tripule
 nem há no mundo porto a que eu não chegue
 e bar no porto em que não dance e beba
 nem há cidade em que ao sofra tédios
 nem selva em que não seja rude e puro
 nem há poema belo que eu não pense…
 A brisa negra apaga-me a vidraça,
 lua e estrelas rasgam-na, ignorando-a,
 – sei todas as perguntas e respostas.
 Agora não há metas impossíveis:
 não há fome a que eu não conheça o pão
 nem há sede a que não descubra água
 nem virgem morta que eu não ressuscite
 nem menino abortado que não crie
 nem há vida vazia que eu não encha
 nem guerra mundial que não evite
 nem salvação do mundo que eu não saiba…
 Etc., etc., muitas coisas mais…
 Vim agora da noite e trouxe tudo.
 Deito-me porque preciso pensar nisso,
 tão simples e maravilhoso e nítido,
 tão súbito que eu sei e nunca vou
 e tombo no cansaço suicida
 de a vida não chegar para fazer
 tudo isso que a noite me ensinou.
 Agora sei porquê e como e quando e quem.
 Amanhã de manhã já não me lembro…
 mas, amanhã à noite, a noite vem!  |