Leonel Neves 

Diálogo, Olhando as Casas
       
                                                                                   
- … mas que casas são aquelas,
tão lindas, mais altas que árvores,
além, na grande clareira?
- Ainda não as tinha visto?
- Não tão bonitas e estranhas,
tão ricamente enfeitadas:
parecem três monumentos…
- … e são! No enorme telhado
de colmo, com tamborzinhos,
colares, conchas, corais
e adornos vários… - Porquê?
- É o mundo dos espíritos
dos antepassados todos
do liurai de Loré.
- … sobre um cubo de madeira
com pinturas esquisitas
(gente, bichos, barcos, formas),
a que se encosta uma escada…
- Esse é o mundo dos vivos.
- E em baixo estacas a prumo,
como grades de um cercado
com galinhas, cabras, porcos…
- É o mundo da Natureza,
que os animais representam.
- Três casas…uma aldeola?
- Não, senhor: são as três casas
do liurai de Loré.
- E aquele vasto palanque,
com tanta mulher sentada
e meninos a brincar…
Fazem ali os batuques?
- É a sala de visitas
do liurai de Loré.
- Mas, de toda aquela gente,
Três figuras sobressaem:
ima velha cachimbando,
talvez a contar histórias
a mulheres e crianças;
a dona de gestos nobres,
rodeada de silêncios,
amamentando um menino;
e a esbelta moça sentada
no cimo de uma escadinha,
a pentear-se. Quem são?
Parecem mãe, filha e neta.
- Ora… são as três esposas
do liurai de Loré.
- Eu julgava que os timores
tinham uma só mulher…
- … e geralmente é assim;
mas mulher custa dinheiro
e dinheiro só o tem
príncipes e pouco mais.
- E neste caso… - É um príncipe
o liurai de Loré.
- E como se paga o dote?
- Os pobres pagam em cabras
mas os mais ricos em búfalos.
- E essas três quanto custaram?
- Bem… eu conheci-as todas
e recordo que a mais velha
era a mais linda e custou
para cima de cem búfalos
ao liurai de Loré.
- Aquela mulher tão velha…
- … quando moça, era a mais bela.
- Mas acha que ela valia
essa fortuna? - Até mais,
na minha opinião e na opinião
do liurai de Loré.
Ai a mocidade, o tempo!
E pergunta-me o senhor
se ela valia cem búfalos.
Se a visse quando era jovem…
Olhe, valia trezentos!…
         
                                               (In Memória de Timor Leste, Pedra Formosa, Edições,
                            Lda, 1989  ISBN  972-8118-15-5)
       
           
Remetente : Antonio Pedro Braga 

[ ÍNDICE DO AUTOR ][ PÁGINA PRINCIPAL ]
 
 
 
Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  23 de dezembro de 1997