José Sarney


Meditação sobre o Bacanga

As águas passam É lua e as casas aparecem. Sou eu. Narciso que se olha E fenece. Tudo é sombra, sombra e nada, água e silêncio nas folhas e vales rompidos pelo Bacanga em sulcos de madrugada. Faixa de vento na montanha a encher e vazar: címbalos onde o tédio geme. É o gigante do não esquecer e as vozes do mangue. Sangue correndo das imagens mordidas pelos dentes estranguladores da noite. Narciso se olha Satanicamente o brilho dos olhares buscam o que não existe mais. Ele vivia além e tinha fome, mas pensava. Comeu os pensamentos devorando os dias o nome e a noite. Doce rio que vem e bóia na enseada. Águas barrentas, sujas, Liberdade que morreu e se afoga no Mar. Medito sobre mim que já sou morto: as canções fúnebres que me pesam como pedras no vazio do lembrar. — Barquinho de vela que vai sobre o mar. Boneca amarela que me vem roubar. meus olhos fenecem e o presságio dorme no espelho das águas que escorrem.

(A Canção Inicial / l954)

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