João Gulart de Souza Gomos
algaravia
						o que se sabe de mim
						é que roubo palavras ao vento
						roubo horas ao tempo
						e imagens à película:
						sou um ladrão de cutículas
						redentor de movimentos
						coleciono momentos
						em pequeninas partículas;
						assalto estórias perdidas
						e o que não sei, invento —
						quixote e moinhos de vento 
						habitam-me alternados
						caminheiro de atalhos
						ignoro as desditas
						e é o que basta dizer:
						que componho versos sem métrica
						e desconheço estilos
						falo do que não entendo
						e calo o que não consinto
						aborreço o meu dia
						e alimento a gaveta
						de papéis escrevinhados
						de outra tanta algaravia
						que nos despe de encantos
						e reclama melodia
						noutro tempo, outro canto
						e outro tanto se cria
						ao falar velhas palavras
						tédio... é meio-dia
						quando os ponteiros se encontram
						e príncipes desencantam
						de coaxos já cansados
						por beijos de lindas donzelas
						... mas isto é já outro caso
						(também de amor, mas sonhado)
						que não nos compete falar.
						tédio... é meia-noite
						e lobisomens se encantam
						de uivos agoniados
						por pragas e maldições;
						e a lua vai se deitar
						em leitos de outros ladrões
Goulart Gomes, Salvador, BA
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