João Ferry


Não Se Pode

Quando eu era menino andava em voga A história da "Não se Pode", Uma mulher esguia, que de toga Como um fantasma, à toa, de pagode Altas horas da noite então vagava. E quando alguém seu nome perguntava Invariavelmente respondia, Com a voz cava e cheia de agonia: "Não se Pode!" "Não se Pode!" Era um fantasma esquisito e feio De estatura comum, mas que crescia Toda vez que cigarros acendia Nos lampiões das esquinas e do passeio. Escaveirada, de carão ossudo, olhos sem brilho, sem nenhum clarão, A "Não se Pode" era um duende mudo Alma penada pela solidão. Soldados de patrulha da cidade Uma noite entenderam de segui-la. Mas a "Não se Pode", como um cão de fila, Evitava qualquer intimidade. Suas pegadas no chão jamais se viu E do velho quartel para o mercado, Seus pontos preferidos, Era como um vulto malfadado Dos mistérios do além, desconhecidos... E quando uma noite fugia pelo espaço "Não se Pode" também no seu regaço Em fumaças de pós se desfazia... A minha alma também é assim Se alguém sacode Os sofrimentos que meu peito esconde Pressurosa e bem triste ela responde: "Não se Pode!" "Não se Pode!"


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