Ives Gandra da Silva Martins


Elegia do Tempo e da Saudade

"Os espinhos de roseira contavam histórias medievais e não faltava ao menino a nítida imagem do que é uma princesa". ALEXANDRE GRAVINAS "Ele sabe que rondas indiferente O muro do seu jardim ............. Ele está preso no jardim. Crê no jardim". MÁRIO CHAMIE
I Ah! não poder antecipar manhãs, Circundado pelas noites do impossível... Erguer as mãos inúteis para o céu, Em súplica sincera, E os olhos, para o inferno dirigidos, Em lagoas de azul desesperado, No silêncio, navegar... Ó dunas transatlânticas, desérticas, Que o calor de teu contato, perdoe-me! Destino sem destino. Meu destino. II Mistério do anterior. Pouco mais e nada. O passado inexistia. Futuro manchado de desejos, Colorido de cores irreais. Presente suspeitante foi a véspera, Presente suspeitante, mas contente. Era o sonho do calmo da existência, Concretizado na falta de tormenta. (Vivência da vida! Quanta angústia refletida nas lembranças! Ó arrependimento, que não cria O quando inatural das coisas nuas, Povoadas de mundos diferentes!) E a marcha, não sentida, desvendava Jardins adormecidos, sem princesa, Na fragrância envitativa do repouso, Para os que tinham sonhos a sonhar. Era tudo irreal como o futuro, Que o cerco do deserto circundante Nunca veio a penetrar. E, assim, embriagado, O menino fez-se, ao toque da ambiência, Poeta e descoberta, Até que certa vez, Sorridente, com a lira, Partiu para o deserto conhecer. III Nasceu quando o tempo era da lua E foi aurora sempre. Imagem feita coração cansado, Na invasão da filha do deserto. (Pobre jardim intemporal da ingenuidade, Fenecido, à distância, Por onde o teu espectro silente!) E o menino espantado percebeu A sensação agonizante do infindável Prender-lhe a alma sem resguardo E levaram-lhe do peito a própria imagem, Era o tempo da lua. A lua grande, no entretanto, Trazia a lividez materna indissolúvel Dos momentos da perda irreparável. Ah! Morte no jardim. Aurora de fogo surgida em tempo novo. Dois mares de azul desesperado. Montanhas sanguíneas entreabertas A pedirem o sangue das irmãs, Por que teus vultos pela areia quente? Tudo longínquo e tudo perto do menino. E o menino sentindo, então, A sede da ilusão insaciável. Ilusão, não mais que isto. Todo o mal foi excesso de ilusão E a pouca realidade das areias quentes. Areias quentes, onde o menino Veio a esquecer-se Que foi poeta no jardim. E o jardim dos tempos idos Era mais descoberta que aventura! Para que a nova descoberta? Marinheiro sem viagem, Tragado na viagem da tortura... Foi aurora quando o tempo era da lua E o brilho de seu rapto fugaz Fez o ódio do menino no deserto, Esquecido o jardim.

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