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			Dimas Macedo 
   
            
 A arte de Lira Juraci
 
 
 
            
 
            Lidam os artistas com a razão e a 
			realidade, como qualquer vivente que se preza. Os recortes da 
			imaginação, contudo, são os achados ontológicos que dão sentido à 
			sua existência atormentada. A imaginação no artista é um plus e os 
			fatos do cotidiano nada mais representam que o porto-sonhar e o 
			ancoradouro da sua estonteante beleza. 
            Não é linear a trajetória biográfica 
			do artista. As linhas das suas incessantes formas de pesquisa, as 
			exceções e reticências, as vacilações pontuais, os devaneios 
			imaginativos, e os signos culturais e estéticos que lhe são 
			correlatos, fazem do mundo do artista um estuário sublime do eterno. 
            Neste livro de Juraci de Lira Furtado, 
			intitulado Contos e Poesias (Fortaleza, Tiprogresso, 2005), para 
			muito além do seu conteúdo rico e sugestivo, e justamente a partir 
			do insight que lhe modela a forma e o sentido, nota-se, sem maiores 
			esforços, a exuberância de uma alma nobre e permanentemente aberta 
			para os vôos maduros da arte literária. 
            A poesia, a ficção, a pintura, a 
			composição musical e os recursos do desenho plástico, reinventados 
			através de torneios alegorizantes, constituem como que os artefatos 
			líricos da sua linguagem criativa. 
            Não é uma estreante a autora de Contos 
			e Poesias. Este livro, a rigor, é o coroamento da sua trajetória 
			literária e do seu sonho de amor sempre acalentado. O seu livro de 
			estréia, intitulado Façanhas do Destino (Fortaleza, Imprensa Oficial 
			do Ceará), veio a público em 1988. E nele já era possível antever a 
			escritora segura que seria Lira Juraci, pseudônimo pelo qual se 
			tornou conhecida. 
            A temática que se articula (e que se 
			projeta) em Façanhas do Destino revela o mundo da cultura rural 
			nordestina e constitui o primeiro bloco das vivências da autora nos 
			espaços remotos do sertão.Lira Juraci nasceu em Cajazeiras/PB, em janeiro de 1925, e 
			justamente neste janeiro de 2005, comemora os seus oitenta anos de 
			existência fraterna e muito proveitosa.
 
            Um sonho alimentou Lira Juraci desde 
			os primeiros tempos da infância: vencer a realidade crua do destino 
			e soerguer um mundo de luz e de beleza, para nele projetar as 
			ressonâncias da sua vida interior, repleta toda ela de sonhos e 
			alteridades. 
            A sua vida pessoal, contudo, me parece 
			recortada de adversidades e vicissitudes. O marido, Alfredo Furtado 
			de Figueiredo, era, como Lira Juraci, natural de Cajazeiras/PB. 
			Casaram-se quando Lira era ainda quase uma menina e o episódio lhe 
			trouxe os valores da maturidade, conduzindo-lhe a alma para os 
			caminhos incertos do futuro. 
            Depois, peregrinações as mais 
			adversas, pois Alfredo, artesão na arte de polimento e conserto de 
			sapatos, tomou gosto pelo empreendimento industrial neste setor. E 
			de forma que, a Indústria de Calçados Boa Fama se tornou com o tempo 
			uma das maiores produtoras de calçados do Norte e Nordeste do País, 
			abastecendo, em Fortaleza, as sapatarias Primavera e Esquisita (Casa 
			Pio, na atualidade). E Lira Juraci acompanhou o marido por cidades 
			como Brasília, São Luiz, São Paulo, Manaus e Belém, localidades onde 
			a Boa Fama se fez a vanguarda do ramo de calçados. 
            O jeito extrovertido de viver do 
			marido, sempre às voltas com a boemia e a dinâmica do mundo de 
			negócios, forneceu a Lira Juraci o entusiasmo e a força necessária 
			para os vôos no domínio da arte. 
            Fez-se compositora e, em 1975, gravou 
			um compacto com as suas principais composições pela Multi-Som, de 
			São Paulo, lançando, como vimos, em 1988, a sua primeira obra 
			literária. 
            As artes plásticas lhe deram o seu 
			primeiro prêmio em 1998 e, a partir desta data, até os dias de hoje, 
			não parou mais de produzir e divulgar a sua criação, nas searas do 
			desenho e da pintura, ganhando destaque, inclusive, em exposições 
			nacionais. 
            Expôs, em 1999, na I Bienal 
			Multicultural de São Luiz e, no mesmo ano, no Salão Sobral de Artes 
			Plásticas, onde obteve o prêmio Revelação, na área da pintura. Ainda 
			em 1999, participou do Salão de Artes Plásticas da Base Aérea de 
			Fortaleza e, em 2000, realizou Exposição Individual no Aeroporto 
			Pinto Martins, e integrou a Exposição – Troféu Bárbara de Alencar, 
			da Fundação Cultural de Fortaleza, arrebatando também o Diploma de 
			Agente Cultural do Parque Araxá, em reconhecimento ao seu trabalho 
			específico no campo da cultura. 
            Artista de talento e mãe exemplar e 
			virtuosa, Lira Juraci me pareceu sempre uma pessoa centrada e em 
			permanente diálogo com a vida. Morrendo-lhe o marido, após 51 anos 
			de casados, assumiu ela os negócios e o controle das fontes de renda 
			da família. Religiosa ao extremo e detentora de fé inabalável, Lira 
			assumiu também o controle da produção dos seus livros, lutando 
			sozinha dessa forma pelo patrocínio e o financiamento da sua obra 
			literária. 
            Musicista, escritora, pintora e 
			possuidora de uma memória fabulosa, Lira Juraci realizou viagens de 
			aprimoramento por diversos países, contando-se entre eles Espanha, 
			Argentina, Portugal e Estados Unidos. 
            Encantada com o brilho das estrelas, 
			admirando a luz e a voz do arco-íris, o perfume das flores e a 
			ternura de Deus que vê disseminada na beleza e na alma de todos os 
			homens, Lira Juraci vive mergulhada nas fontes sublimes da 
			imaginação. E nesse mundo mágico e deslumbrante, lança mão a autora 
			de letras e pincéis, ora desenhando a palavra, ora cravejando de 
			cores os sentidos impassíveis do belo. 
            Entre as suas criações, no entanto, 
			uma me parece distinta das demais, porque em Deus, acredito, e 
			somente em Deus, inspirou-se ela para fazê-la ainda mais bela e 
			duradoura. Trata-se do artista plástico Wando Figueiredo, seu filho 
			dileto e que é, de forma indiscutível, um dos maiores gênios das 
			artes plásticas no Brasil, na atualidade. 
            Finalizando, acho que nada mais resta 
			a dizer de Juraci de Lira Furtado e da sua bela visão de artista. 
            Atenho-me, portanto, no momento, ao 
			conteúdo de Contos e Poesias, para, por derradeiro, dizer que o seu 
			livro, quer no campo da ficção, quer na seara do poema ou da 
			partitura musical, é todo ele repleto de inspiração, sonhos e 
			miragens, de recordações da infância e, fundamentalmente, de gestos 
			e olhares que brotam do amor e que apontam, maduros, para a 
			plenitude da vida, para os enigmas insondáveis de Deus e para suas 
			escrituras de luz e de mistério.
 
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