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Marco Lucchesi




Interminabilis Vitae Possessio
 
 

 

A Via Estreita de Alexei Bueno é uma obra-prima. Nem mais. Nem menos. Trata-se de um poema total. Como o de um Coleridge ou de um Hölderlin, das grandes elegias. Alta metafísica, como a de um Hopkins. Densa como a de um Betocchi. Ampla como a de um Khliébnikov. Apenas poesia. Eis a sua radicalidade. Apenas. Nada mais claro e mais misterioso, mais literal e mais alegórico, mais profundo e mais direto do que A Via Estreita. E por quê? Porque existe um momento na vida do filósofo em que ele "deixa de ser" filósofo. Assim aconteceu com o Bachelard noturno, o da Poética do Espaço (e aqui seu pensamento abriu fronteiras). O mesmo vale para o poeta. Penso no Jorge de Lima dos XIV alexandrinose no Jorge de Lima da Invenção de Orfeu.

No primeiro e no segundo Blake, embora jamais tenha existido em termos absolutos um primeiro e um segundo. Não salta a natureza. O segundo estava no primeiro.

Alexei Bueno "deixa de ser" poeta para habitar a poesia.
Vejo aqui o mesmo Alexei de Poesias, de Lucernário, de A Decomposição de Johann Sebastian Bach ou da tradução de As Quimeras, de Nerval. Poesia pura: a caducidade das coisas, as lágrimas do Heráclito, o sentimento do mundo. Do tempo e da eternidade. A vida sendo uma árvore no outono universal. Donde a busca do ponto ômega: interminabilis vitae tota simul et perfecta possessio, como vemos na Consolação da Filosofia.

Conquanto o primeiro e o segundo Alexei representem uma incindível continuidade, temos aqui toda a máquina do mundo. O microcosmos e o macrocosmos. E uma surpreendente herança neoplatônica: traduzir o intraduzível, representar o irrepresentável, clarear a opacidade do primeiro princípio. Eis o maior desafio de Alexei: traduzir, representar a máquina do mundo, com suas engrenagens invisíveis e não matemáticas, o drama e a redenção de um ser em trânsito.

A Via Estreita começa com um ainda-não e termina em pleno coração divino, amor intelectual de Deus (sive Natura). Todo o livro II da Ética de Spinoza comparece aqui. Assim, pela amplitude dos temas, pela solidão de seu gênio, e por todo o apelo de fogo que atravessa as dez odes, a obra de Alexei é poesia da poesia. Nem mais. Nem menos. Uma obra-prima.


 




Leia a obra de Alexei Bueno