Alcides Werk


O Ouro do Rio Amana

Tuas doces águas, Amana, de repente se toldaram. Chegaram dragas, pontões, canoas, motores, balsas abarrotadas de homens falando gírias estranhas, escafandros, pás, bateias, mecanismos de sucção a revolver-te as entranhas, e o teu relevo de margens: foi decifrado o segredo do teu rico aluvião. As cobiças pessoais precisam catar o ouro para urgências nacionais. Cadê teus patos selvagens, teus amenos inambus, tangurupará voltando (segundo registra a lenda) de lutas com o japiim, o som rouco das ciganas a voz dos uirapurus, o alarido dos guaribas, os bandos de caititus, os socós-boi meditando, jacarés-pedra espiando, tracajás quase dormindo na beira, esquentando o sol? Cadê tuas ariranhas, tuas antas e capivaras, teus tambaquis, tuas piranhas pretas, teus pirarucus, teus surubins, teus pacus, araris e pirararas? Vai, leva ao Parauari (que também foi descoberto) teu choro amargo de virgem possuída sem amor. Conta que há alto-falantes espantando os papagaios; que em cada motor-de-linha chegam novos garimpeiros; que as vilas vão-se formando nas margens, e em cada tenda há muitas coisas a venda e mulheres de aluguel (brancas, louras, que adoecem por rejeição natural); que há muito cabra-da-peste e cenas de faroeste, cachaça, carne-de-lata, cigarro, pilha, sardinha, leite-moça, mosquiteiro, lanterna, charque do Sul. Entrega teu ouro, Amana, quanto mais cedo melhor. Quero que sejas tão pobre que nem se lembrem que existes. Depois do caso passado, mesmo sabendo que és triste, quero fazer um roçado, levantar um tapiri, deixar o mundo de lado e morar perto de ti.


* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *