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Pablo Picasso
13 DE MAIO DE 1941 Casulo de sangue posta sobre os ombros
desnudos de trigo verde trêmulo entre os lençóis úmidos
orquestra sinfônica de carnes despedaçadas que pendem das
árvores em flor da parede pintada de ocre que agita suas grandes
asas verdes maçã e branco malva destroçando o bico
contra os cristais arquiteturas de sebo coalhado sobre as ondas dos perfumes
de terra de música e de pássaros cesta repleta de provisões
rodeada de rosas trepadeiras fixadas como enxame de abelhas na cabeleira
despenteada da paisagem exposta ao sol, com as quatro patas da montanha
de arroz das rochas pousadas sobre as pedras afundadas no barro do céu
até os tornozelos a língua pendente do arado pegada aos sulcos
sua o chumbo do peso do esforço realizado no centro do ramalhete
torcido pelas cadeias dos dentes das flores surpreendidas no meio da pele
rugosa de seus olhos fixos de cima a baixo do vestido e suas pregas desfeitas,
seus dilaceramentos, o desgaste da tela coberta
de manchas os mil e um rasgões sua imundície, a piolharia
os arcos dourados das pedras que se pavoneiam e as janelas fechadas ao
longe sobre as casas incrustadas na areia fina das árvores do bosque
e os bocejos das plumas brancas que voaram do copo d'água pescoço
erguido os grandes círios acesos das enormes barcas deixadas junto
ao brocal do poço escutam o perfume da chuva que sopra na flauta
os dedos das verdes olivas.
2 DE ABRIL DE 1942 Não foi inútil aos três corpos feitos de barro e de luz ficar envoltos em sombra e em tristeza superar o quarto de século em reconstrui-los totalmente as asas que se arrastaram cumuladas de azul eriçadas de todas as suas flores construíram sobre o granito das rochas duramente em cada piso na janela está iluminada com a candeia escurecendo a borda roída do prato a interminável cadeia de túnicas agitada silenciosamente pela lua o cheiro tão violento do tom violeta escuro espargido sobre o verde maçã e o rocio que empapa de rosa o limão pendem até o completo afogamento a acre música laranja que exala seus cálidos suspiros à indulgente orelha aberta do amarelo ocre bruscamente desperto pelas palavras duras e ternas do excessivo perfume branco furta-cor do cristal que a reflete completamente nua miserável comida de bodas celebrada tão ruidosamente tão vergonhosamente em plena solidão chamada às 11 pela manhã destacando-se do lago de suave marulhada a pele que sustenta o barco atado ao ramo que cheira um copo de leite o sortilégio que atua diretamente sobre seu destino o engloba no marfim polido de onde gotejam fotos fátuos acesos bruscamente em cada folha que move um dedo de ar passeia o óleo de seus lábios por toda a extensão do braço desenhado pela relva. |
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